À beira de um ataque de nervos


por Fernando Brito, Tijolaço -

Em outros tempos, pareceria “forçação de barra”.

Mas o tema que a Época aborda na edição do final de semana, afinal, coincide com tantas manifestações que tenho lido nos comentários e ouvido de amigos – vários deles, aposentados, pensando em “dar no pé” do país – que achei justo destacar a reportagem da revista que afirma que a crise política e econômica está causando surtos de depressão, angústia e abuso do álcool.

Claro que, ao longo da história, crises sociais e crises pessoais sempre tiveram forte associação.

Mas, desta vez, há um ingrediente novo: o ódio, intolerante e intransigente, que torna tudo pior, até porque envenena relacionamentos afetivos e familiares, antes um porto em geral seguro para vidas e almas avariadas.

Transcrevo alguns trechos, até porque na matéria inteira há muitas questões que, fora do âmbito estritamente pessoal, não interessam. Mas outras são coletivas. E pior, generalizadas:

Muitos se sentem insanos neste momento porque o Brasil e o mundo estão longe do que se convencionou chamar de são. As crises — política, econômica, ambiental, cultural — abalam o otimismo natural dos homens e a crença na bondade humana e no progresso.(…)

Christian Dunker, psicanalista e professor da Universidade de São Paulo (USP), disse não se lembrar de tempos como os atuais. “Atendo há 30 anos, já assisti a outros momentos tensos. Mas nunca a política ocupou tanto espaço na vida das pessoas.” Para Dunker, o presidente Bolsonaro é um agente de ativação “das modalidades de sofrimento e de sintoma que já estão presentes” nas pessoas. “Ele torna mais agudo os conflitos familiares, de raça, de gênero, de classe”.

Outro fator é a precarização do trabalho e da renda, apontada pelo psiquiatra e psicanalista Nilson Sibemberg como fator de depressão e angústia. “As pessoas estão com um temor muito grande de perder aquilo que é seu sustento. Isso se traduz em mais depressão e mais angústia”, afirmou.(…)

Para Dunker, o presidente Bolsonaro é um agente de ativação “das modalidades de sofrimento e de sintoma que já estão presentes” nas pessoas. “Ele torna mais agudo os conflitos familiares, de raça, de gênero, de classe. Faz isso ao se instituir como referência simbólica para a prática da autoridade pública, o registro opressivo. Isso tem poder de incrementar a angústia que já estava lá.”

O psiquiatra e psicanalista Rodrigo Lage, da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, tem observado “a exacerbação de ansiedade e de angústias, muitas vezes ante manifestações públicas de governantes que geram medo e insegurança”. (…)

Gostaria de dizer que tudo isso vai passar, como passará o governo Bolsonaro. Mas é forçoso reconhecer que na economia e nas cabeças, estes tempos deixarão cicatrizes que só com muito tempo não arderão mais.

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