Marcia Lia, Blog: Maria Frô
"Pouco a pouco estamos assistindo, no
Brasil, a desconstrução de um elenco de direitos conquistados no período
pós-democratização, especialmente nos últimos 13 anos, desde que Lula
chegou à Presidência da República. E não tenham dúvidas: a desconstrução
da imagem pessoal e institucional da presidenta Dilma serve também a
esse propósito, com o agravante de servir a um projeto pessoal de poder e
de sobrevida nele, no pós-operação-faxina bancada pelo governo Dilma.
Correlato a isso, avalio que está em
curso um processo de ‘construção da intolerância’, onde a ira e a
intransigência substituem qualquer possibilidade de diálogo como caminho
para a solução de conflitos. É sintomático e preocupante, porque
poderemos voltar rapidamente, enquanto Nação, a um desequilíbrio de
forças sociais que marcou a própria colonização do país, por centenas de
anos, com a já conhecida pilhagem dos nossos recursos naturais e com o
boicote à luz que o verdadeiro ensino traz às pessoas permitindo
transformar opressão em liberdade; carência em fartura; desrespeito em
respeito; e país em Nação.
Está claro, a meu ver, que essa
construção passa pela cessação de direitos legais, pela divisão objetiva
ou subliminar da sociedade entre os que ‘merecem’ e os que ‘não
merecem’, amplamente noticiados pela mídia comercial, e quase sempre sem
questionamento. Prestem atenção: muitos dos comentários que lemos e
ouvimos são uma homenagem à intolerância. E o pior é que as pessoas
começam mesmo a se sentir superiores ou inferiores, onde quer que
estejam: no cotidiano, nas instituições, na vida pública ou na vida
privada. É como se acostumar com a dor mesmo sabendo que há remédio, mas
este ‘não lhe pertence’. É como beber e matar no trânsito e saber que
sua condição financeira ou seu sobrenome garantirá que a ‘pena lhe seja
leve’.
Portanto, o muro da desigualdade de
direitos está sendo erguido travestido de moralidade e de amor à Pátria,
afetando diretamente as chamadas minorias: mulheres, crianças e
adolescentes, negros, indígenas, população LGBT e quilombolas.
A revisão do Estatuto do Desarmamento
atende muito mais aos interesses da indústria bélica do que aos
interesses da sociedade em coibir a violência; na mesma toada, há o
projeto da redução de maioridade penal, que na prática desobriga os
governos a disputarem os jovens com o crime por meio de educação e
políticas públicas inclusivas: ‘cadeia neles, ora bolas’. Ou,
ressuscitar o projeto 4330/2004 que amplia a possibilidade terceirização
da mão de obra. Interesse de quem?
Na pauta recente, a transferência da
responsabilidade pela demarcação de terras indígenas do Governo Central
para o Congresso e o projeto que regulariza ativos no exterior, não
declarados, são sinais escandalosos dos interesses que pautam as
discussões. São sintomas de uma doença que afetará a todos, porque não
se iludam: O mal que atinge nosso vizinho nos atinge também,
independente se concordamos ou não com ele, ou se gostamos ou não das
mesmas coisas que ele.
Por trás da responsabilização e da
criminalização de um único partido (que cometeu erros, sim), a
impunidade e os interesses nada moralistas campeiam à nossa frente."
*Marcia Lia é Deputada estadual pelo PT em são Paulo
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