Luis Nassif, GGN
A
manchete alertava os leitores do conteúdo exclusivo da reportagem:
”Documentos apontam que MP editada na gestão Lula foi 'comprada' por
lobby”.
A reportagem do Estadão era estrondosa.
Dizia
que uma MP (Medida Provisória) editada em 2009 pelo governo Lula, teria
sido “comprada” (assim, entre aspas) por um lobby visando favorecer a
indústria automobilística. Falava-se em quantia de até R$ 36 milhões
para conseguir a prorrogação de incentivos fiscais de R$ 1,3 bilhão por
ano para indústrias automobilísticas das regiões nordeste e
centro-oeste.
***
A
matéria mencionava pagamento de R$ 2,4 milhões a um filho de Lula...
dois anos depois que a MP foi aprovada. Para estabelecer alguma relação
de causalidade, a reportagem informa que a MP entrou em vigor também de
2011. Ah, bom! Primeiro caso de suborno que não é pago no ato.
Segundo
a reportagem, a CAOA (que não é flor que se cheire) e a MMC Motores
(subsidiária da Mitsubishi) pagariam honorários a um escritório de
advocacia que seria responsável pelo suborno.
***
Aí entra o samba da reportagem doida.
Segundo
a mesma reportagem, na correspondência interceptada, ficava-se sabendo
que as empresas transferiram R$ 4 milhões para o lobista pagar “pessoas
do governo, PT”. Segundo a matéria, o advogado “faltou com o
compromisso”. O que, em tucanês, quer dizer, não pagou ninguém.
O
texto sugere que o suborno se estendeu a “deputados e senadores”, sem
mencionar nomes. Mas dá ênfase à tese do suborno mesmo sabendo-se – pela
própria reportagem –que a CAOA recuou do pagamento quando descobriu que
o advogado estava desviando recursos.
Tudo isso consta da matéria.
Mesmo
assim o jornal optou pela manchete taxativa: “Documentos apontam que MP
editada na gestão Lula foi ‘comprada’ por lobby”. Ou seja, uma manchete
que é desmentida pela própria matéria.
***
Não se parou nisso.
No decorrer do dia, o repórter policial do jornal soltou outra matéria onde dizia que “Mensagens obtidas pelo Estado,
que estão sendo investigadas pela Polícia Federal e o Ministério
Público Federal, indicam que houve a oferta de propina para agentes
públicos viabilizarem a MP”.
Não era verdade, conforme se leu na matéria original.
Mostrando
que o ridículo não tem limites, a melhor síntese do novo PSDB, deputado
Carlos Sampaio, solicitou ao Procurador Geral da República que
investigasse a denúncia: “Os fatos são de extrema gravidade e, caso
comprovados implicam a antiga cúpula do governo Lula, inclusive o
próprio ex-mandatário”.
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Para ajudar nas investigações, o bravo deputado – que também é procurador estadual – deveria correr ao endereço http://migre.me/rGCBX onde se encontram as provas do crime.
A
MP prorrogava incentivos criados no governo FHC, por inspiração do
senador Antônio Carlos Magalhães, visando estender para as demais
regiões do país incentivos disponíveis para as empresas do Sudeste.
A
MP foi aprovada no Senado por um acordo de lideranças. Por unanimidade.
Só alguém extremamente crédulo para supor a necessidade de pagamento de
propinas para medidas de aprovação unânime.
O então combativo senador Tucano Arthur Virgílio, depois de saudar ACM declarou em alto e bom som: “O
Brasil só será feliz quando as nossas riquezas forem melhor
distribuídas. Que o Brasil um dia realize o sonho de ser desenvolvido em
todas as regiões e não se faz isso concentrando investimentos em uma ou
duas”.
Se
não quiser enquadrar Virgílio, o bravo Sherlock Sampaio poderá pegar no
pé do senador José Agripino (DEM-RN), frequentador das tertúlias de
FHC, que garantiu que “nenhum estado nem município perderá com a
aprovação da MP. E foi mais um a ressaltar a "clarividência" de Antônio
Carlos Magalhães na luta pela aprovação do benefício”.
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Para
mostrar sua absoluta isenção, Sampaio deverá inquirir pessoalmente seu
colega Tasso Jereissati (PSDB-CE), que declarou que o incentivo foi um "trabalho histórico, um março na história do Nordeste brasileiro".
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Depois,
todos se reunirão satisfeitos com o guru FHC, em um café da manhã na
rua Rio de Janeiro, em Higienópolis, saboreando a manchete que o Estadão
utilizará na edição impressa desta sexta-feira, para saudar seu notável
feito jornalístico."
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