![]() |
Pela ordem: Aurélio Rios, Veridiana Alimonti, André Barbosa e Eugênio Bucci |
Lilian Milena, GGN
O serviço de comunicação é compreendido nos Estados Unidos, França, Alemanha e Reino Unido como um setor comercial que tem como característica se monopolizar naturalmente. Por isso, nesses países existem leis para a regulamentação econômica desse mercado, induzindo a competitividade, consequentemente, impedindo a concentração dos meios de comunicação nas mãos de poucos grupos.
.
No Brasil é diferente. Os 25 anos da promulgação da Constituição
Federal não foram suficientes para que parlamentares criassem leis para
regulamentar os artigos do Capítulo V, que versam sobre a comunicação
social no país. A primeira consequência disso é a excessiva concentração
de rádios, TVs, revistas e jornais impressos por alguns grupos.
Organizações pelo direito à informação, dentro e fora do país, estimam
que 70% das mídias estão nas mãos de menos de dez famílias, e muitas
rádios e TVs locais são propriedades de políticos.
.
O debate sobre o tema voltou à tona no discurso de posse do novo ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, no início deste ano. Na ocasião, ele declarou que levará adiante a promessa da presidente reeleita, Dilma Roussef, de debater a regulação econômica da mídia. O objetivo inicial de Berzoini é abrir o tema para a população colaborar com propostas, num processo que poderá ser semelhante àquele que culminou na criação do Marco Civil da Internet. Especialistas convidados para debater o assunto no programa Brasilianas.org (TV Brasil), acreditam, no entanto, que o trabalho do Ministério das Comunicações não será nada fácil, tendo em vista o momento político, e o uso de velhas distorções, relacionando a proposta de regulamentação econômica à censura dos meios de comunicação.
.
O debate sobre o tema voltou à tona no discurso de posse do novo ministro das Comunicações, Ricardo Berzoini, no início deste ano. Na ocasião, ele declarou que levará adiante a promessa da presidente reeleita, Dilma Roussef, de debater a regulação econômica da mídia. O objetivo inicial de Berzoini é abrir o tema para a população colaborar com propostas, num processo que poderá ser semelhante àquele que culminou na criação do Marco Civil da Internet. Especialistas convidados para debater o assunto no programa Brasilianas.org (TV Brasil), acreditam, no entanto, que o trabalho do Ministério das Comunicações não será nada fácil, tendo em vista o momento político, e o uso de velhas distorções, relacionando a proposta de regulamentação econômica à censura dos meios de comunicação.
.
O Brasil já teve leis de imprensa, antes de 1988, mas que nunca
foram efetivamente respeitadas. O superintendente executivo de
relacionamento da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) e ex-representante
da presidência no processo de instalação da TV digital no Brasil, André
Barbosa, lembrou, por exemplo, que a legislação de 1962, feita antes do
Golpe Militar, proibia que donos de TVs e rádios de usassem esses
instrumentos para fazer ativismo religioso e partidário. A normativa
abordava também a regionalização, ou seja, a necessidade dos programas
transmitidos não deixarem de lado as diferenças culturais do Brasil.
.
.
O professor da Escola de Comunicação da USP, e especialista em
crítica e conceito de ética jornalística, Eugênio Bucci, também
convidado do programa, explicou que a regulação dos meios de comunicação
significa, apenas, disciplinar um setor do mercado.
.
.
“Não existe um mercado sem regulação, a não ser que estejamos
falando de mercados paralelos, como de tráfico de droga, onde as coisas
ocorrem por baixo do pano”, ponderou. Bucci completou que a ausência de
regras “é um atraso no Brasil”, e não pode ser comparada à perda de
liberdade.
.
.
“Pelo contrário, a ausência de regras democráticas é que favorece a
apropriação indevida do que é de todos por alguns poucos”, disse. O
professor, que também é colunista da Revista Época, fez questão de
lembrar que a FCC, agência reguladora dos meios de comunicação dos
Estados Unidos, foi criada ainda na década de 1930, “impondo regras
públicas que regulam o mercado privado”, e destacou que a bandeira de
trazer para o setor de comunicações um disciplinamento democrático não
pode ser visto como algo de esquerda ou de direita. “Ela é uma bandeira
que expressa uma necessidade do estado democrático”.
Veridiana Alimonti, advogada do Intervozes, grupo que luta pela
democratização dos meios de comunicação, ressaltou durante o programa a
importância de compreender que a regulação da mídia também está ligada à
concretização de direitos fundamentais como cultura, educação,
informação e liberdade de expressão.
“É interessante avaliar que a vedação ao monopólio e ao oligopólio
que consta na Constituição Federal, que trata da comunicação social,
está justamente no artigo que garante a liberdade de expressão nos meios
de comunicação social, numa compreensão que é a seguinte: para garantir
a liberdade de expressão na comunicação social não pode haver monopólio
ou oligopólio nos meios de comunicação”, pontuou.
Igrejas e TVs
O professor Bucci, entretanto, disse não estigmatizar o controle
dos meios de comunicação no país por poucas famílias, acreditando que
não existem dados confiáveis a respeito da questão e, ainda, que
“oligopolização” é uma tendência mundial. O que ele criticou foi a falta
de uma definição numérica, na Constituição Federal, do que seria o
monopólio ou o oligopólio no setor de comunicações. “Seria o domínio de
70% ou 60% da audiência?”, exemplificou.
Essa questão, portanto, só poderá ser corrigida mediante a criação
de uma lei ordinária, regulando o Capítulo V da Constituição. O ponto
mais preocupante, na visão do professor, é o uso de canais de televisão e
rádio por igrejas, independente de qualquer que sejam as denominações.
“Aí temos um problema grave porque, na democracia, a atividade
religiosa não sofre as restrições e as exigências legais que a atividade
comercial sofre”. Partindo desse princípio, Bucci vê o risco dos meios
de comunicação religiosos conseguirem transpor esse direito ao uso que
fazem dos meios de comunicação de massa.
Censura
O procurador federal dos Direitos do Cidadão, Aurélio Rios,
ressaltou durante o programa Brasilianas.org que a regulação econômica
deve ser entendida como uma questão de democratização dos meios de
comunicação. “Não é apenas retórica política, consta na Constituição”,
continuou. Entretanto, o procurador disse não acreditar que o Congresso
discuta com profundidade o tema, nos próximos anos, ou que seja capaz de
regular com isenção. A esperança, para ele, é que, pelo menos, alguns
pontos avancem.
Aurélio Rios identificou que o grande problema é a distorção feita
entre censura e regulação da mídia. “Esse é um ponto grave dentro da
discussão, como se qualquer tipo de regulação de um setor importante,
como é o da comunicação social, significasse o cerceamento da liberdade
de expressão, ou a censura. Para nós, [isso] é uma confusão que,
obviamente tirando à má intensão de um ou de outro, é absolutamente
primária”, avaliou.
É importante destacar, sobre o tema, que a própria Constituição, no
parágrafo 2, do Capítulo V, veda "toda e qualquer censura de natureza
política, ideológica e artística". A advogada do Intervozes, Veridiana
Alimonti, reforçou esse ponto, destacando que nas propostas apresentadas
de regulação econômica não existe nenhum ponto relacionado a censura de
conteúdo. Entretanto, ela é a favor da criação de dispositivos legais
que responsabilizem civilmente a veiculação e produção de notícias
falsas.
Um exemplo sobre isso foi o caso da Escola Base, em 1994, quando o
casal Icushiro Shimada e Maria Aparecida Shimada, donos de uma escola
particular na cidade de São Paulo, foram acusados injustamente pela
imprensa de abuso sexual contra alguns alunos. A acusação equivocada
levou ao fechamento da escola. Pouco tempo depois o caso foi arquivado
por falta de provas. Em 1995, os Shimada moveram uma ação por danos
morais contra o Estado e a imprensa, que apelou para todas as manobras
possíveis para postergar o pagamento de indenizações. Em 2007, Shimara
faleceu de câncer. Em abril de 2014, aos 70 anos, Icushiro faleceu
devido a um infarto.
Eugênio Bucci ressaltou que a censura também pode ser exercida por
grupos de mídia, quando negam, por exemplo, abordar algum tipo de
informação importante à população. Por outro lado, esclareceu que esse
mal é corrigido nos mercados competitivos, ou seja, quando os espaços
para diversos meios de comunicação é equilibrado.
“Ora, se uma rede de tv faz um noticiário enviesado, mas outra rede
apresenta outro lado, o debate público compensa essas distorções”,
completou. O professor lamentou que o assunto sobre a regulação da mídia
seja pouco debatido pelos próprios meios de comunicação, sejam eles
públicos ou privados. “Infelizmente é um assunto que se tornou uma
espécie de tabu”, concluiu."
Comentários