"Porta-voz informal das Organizações Globo, o colunista Merval Pereira publica nesta terça um artigo que serve como roteiro de eventual processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff; a última frase é quase uma tentativa de sedução ao PMDB; segundo Merval, "se a acusação contra a presidente for por crime de responsabilidade pela sua atuação no caso da Petrobras, apenas ela será impedida, podendo assumir o vice-presidente Michel Temer"; no fim de semana, ao pregar o "golpe democrático", o colunista Ferreira Gullar falou da necessidade de cooptar forças políticas ainda ligadas ao petismo para "salvar a democracia"; é o mesmo argumento que o Globo usou em 1964 para defender a ditadura militar
Brasil 247
O jornalista Merval Pereira, colunista do Globo e nome da casa mais alinhado com o PSDB e com os irmãos Marinho, publicou, nesta terça-feira, uma coluna que funciona como uma espécie de roteiro do golpe para a derrubada da presidente Dilma Rousseff.
Embora o texto se chame "Sem 
golpismos", é justamente do golpe contra uma presidente reeleita há 
menos de um mês que ele trata. Um escárnio.
Merval percorre a mesma seara 
aberta no fim de semana por outro colunista conservador, o poeta 
Ferreira Gullar, que, no fim de semana defendeu uma espécie de "golpe 
democrático", como se ele fosse necessário para "salvar a democracia" – 
exatamente o mesmo argumento que o Globo usava em 1964 para defender o 
regime militar e a derrubada de João Goulart (leia aqui a proposta de golpe defendida por Ferreira Gullar).
Os dois colunistas, tanto Merval 
quanto Gullar, fazem um gesto de sedução ao PMDB. Na sua coluna no fim 
de semana, o poeta afirmou que seria necessário cooptar forças ainda 
alinhadas com o petismo. Merval, por sua vez, fala em dois caminhos para
 o impeachment, que ele parece ver como inevitável.
No primeiro modelo de impeachment,
 tanto a presidente Dilma quanto o vice Michel Temer seriam atingidos 
pelo furacão. Neste caso, a acusação estaria relacionada ao 
financiamento da campanha eleitoral. "No
 caso da presidente Dilma, no entanto, se a acusação for o financiamento
 da campanha eleitoral por dinheiro ilegal provindo do petrolão, também o
 vice Michel Temer estará impedido, pois é a chapa que será impugnada", 
diz Merval, lembrando, que, neste caso, haveria novas eleições em 90 
dias.
No entanto, Merval propõe um golpe mais palatável para o PMDB e mais sedutor para Michel Temer. "Caso,
 porém, a acusação contra a presidente for por crime de responsabilidade
 pela sua atuação no caso da Petrobras, apenas ela será impedida, 
podendo assumir o vice-presidente Michel Temer", diz ele.
A Globo piscou para Michel Temer. Ele se deixará seduzir?
Leia, abaixo, o texto de Merval:
Sem golpismos
Merval Pereira
As manifestações a favor do 
impeachment de Dilma, seja nas ruas, seja de políticos oposicionistas ou
 de meios de comunicação, podem ser precipitadas, inconvenientes 
politicamente, mas nunca golpistas, como defensores do governo as 
rotulam na expectativa de reduzir seu ímpeto. Nada têm a ver, pois, com 
pedidos de intervenção militar, esses, sim, vindos de uma minoria 
golpista.
A razão da demanda existe pelo 
menos em tese: seria a indicação, feita pelo doleiro Alberto Youssef, de
 que a campanha de 2010 foi financiada por dinheiro do petrolão. E ainda
 está para ser aprovada a prestação de contas da campanha deste ano, que
 até segunda ordem será analisada no TSE pelo ministro Gilmar Mendes.
Ou ainda um crime de 
responsabilidade por não ter a presidente impedido o uso da Petrobras 
para financiamentos de sua base política, ou ter compactuado com esse 
esquema, durante o período em que foi a principal responsável pela área 
de energia.
No mensalão, quando o publicitário
 Duda Mendonça confessou que havia recebido pagamento no exterior, num 
paraíso fiscal, pelo trabalho de campanha de 2002, abriu-se a 
possibilidade concreta de impeachment do então presidente Lula, que não 
foi adiante por uma decisão política da oposição.
E quem diz que não há golpismo em 
usar a Constituição para destituir um presidente é o ex-presidente Lula,
 que aparece em um vídeo que se espalha pela internet defendendo essa 
tese em um programa de televisão após o impeachment de Collor, liderado 
pelo PT na ocasião. Disse Lula: "(...) foi uma coisa importante o povo 
brasileiro, pela 1ª vez na América Latina, dar a demonstração de que é 
possível o mesmo povo que elege um político destituir esse político. 
Peço a Deus que nunca mais o povo esqueça essa lição".
As democracias mais sólidas do 
planeta preveem a possibilidade de impeachment do presidente, e um 
exemplo disso são os EUA, onde nos anos recentes dois presidentes foram 
alvos de uma ação dessas pelo Congresso. Um, o ex-presidente Bill 
Clinton, envolvido em um escândalo sexual na Casa Branca, escapou da 
punição no Congresso, e outro, Richard Nixon, acabou renunciando diante 
da certeza de que seria impedido pelo Congresso.
No Brasil, o presidente reeleito 
pode ser impedido por fatos ocorridos no mandato anterior, pois o artigo
 15 da lei 1.079, de 10 de abril de 1950, que "define os crimes de 
responsabilidade e regula o respectivo processo de julgamento", diz que a
 "denúncia só poderá ser recebida enquanto o denunciado não tiver, por 
qualquer motivo, deixado definitivamente o cargo".
De acordo com o parágrafo 
primeiro, e seus incisos, do artigo 86 da Constituição, "O presidente 
ficará suspenso de suas funções: I - nas infrações penais comuns, se 
recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal; II - 
nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo 
Senado".
Pelo mesmo motivo, Lula não pode 
ser acusado de crime de responsabilidade por atos cometidos nos oito 
anos de sua gestão à frente da Presidência. Caso venha a ser acusado de 
algum crime, será julgado na Justiça de 1ª instância, sem foro 
privilegiado.
Julgado procedente o pedido de 
impedimento, pelo Senado, do presidente (artigo 52, § único, da 
Constituição), assumirá o vice-presidente, em caráter definitivo, nos 
termos do artigo 79, caput, da Constituição.
No caso da presidente Dilma, no 
entanto, se a acusação for o financiamento da campanha eleitoral por 
dinheiro ilegal provindo do petrolão, também o vice Michel Temer estará 
impedido, pois é a chapa que será impugnada, e, nesse caso, de acordo 
com o artigo 81, caput, da Constituição, "far-se-á eleição, noventa dias
 depois de aberta a última vaga".
Seria um caso diferente do que 
aconteceu com o ex-presidente Fernando Collor, pois naquela ocasião 
apenas ele foi acusado dos desvios de dinheiro, enquanto seu vice Itamar
 Franco pôde assumir a Presidência, pois não foi envolvido nas 
acusações. Caso, porém, a acusação contra a presidente for por crime de 
responsabilidade pela sua atuação no caso da Petrobras, apenas ela será 
impedida, podendo assumir o vice-presidente Michel Temer."

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