Mauro Santayana, Blog: Mauro
Santayana
“O governo
brasileiro tem tratado com deferência o Sr. Emilio Botin, dono do Grupo
Santander, já investigado pela justiça espanhola, entre outras coisas, por
remessas ilegais de dinheiro para o exterior e duvidosas contas na Suiça,
pertencentes à sua família desde os tempos do franquismo. Ele comanda um grupo
que teve que pegar, direta e indiretamente, no ano passado - em dinheiro e
títulos colocados no mercado - mais de 50 bilhões de euros emprestados; demitiu
dois mil empregados no Brasil no mesmo período, e teve uma queda de 49% em seu
lucro global nos últimos 12 meses, devido, entre outras razões, a provisões
para atender a ativos imobiliários “podres” no mercado espanhol.
A mera leitura
dos comentários dos internautas espanhóis sobre o Sr. Botin daria, a quem
estivesse interessado, idéia aproximada de como ele é visto em seu próprio
país, e de como há quem preveja, com base em argumentos financeiros, que a
bicicleta do Santander pode parar de rodar nos próximos meses, com a quebra do
grupo ou, pelo menos, de seu braço controlador, ainda em 2013.
Nos últimos dez
anos, as remessas de lucro para as matrizes de multinacionais – muitas delas
estatais controladas direta ou indiretamente por governos estrangeiros –
chegaram, no Brasil, a 410 bilhões de dólares, ou pouco mais que nossas
reservas internacionais, duramente conquistadas no mesmo período.
Ora, se as
multinacionais trazem dinheiro, e contribuem para aumentar o clima de
competição em nossa economia, é natural que elas mandem seus lucros para o
exterior. O problema, é que, na indústria, na área de infra-estrutura ou de
telecomunicações, quem está colocando o dinheiro somos nós mesmos.
O BNDES tem
colocado a maior parcela de recursos, e assumido a maior parte do risco, em
empresas que mandam, apesar disso, ou por causa disso mesmo, bilhões de dólares
para seus acionistas no exterior, todos os anos. Mais de 70% da nova fábrica da
Fiat em Pernambuco foi financiada com dinheiro público. A Telefónica da Espanha
recebeu do BNDES mais de 4 bilhões de reais em financiamento para expansão de
“infraestrutura” nos últimos anos. E mandou mais de um bilhão e seiscentos
milhões de dólares para seus acionistas espanhóis, que controlam 75% da Vivo,
nos sete primeiros meses do ano passado.
A OI, que também
recebeu dinheiro do BNDES, emprestado, e era a última esperança de termos um
“player” de capital majoritariamente nacional em território brasileiro, corre o
risco de se tornar agora uma empresa portuguesa, com a entrega de seu controle
à Portugal Telecom, na qual o governo português – que já dificultou inúmeras
vezes a compra de empresas lusitanas por grupos brasileiros, no passado -
conserva mecanismos estratégicos de controle.
Empresas
estatais estrangeiras, como a francesa ADP (Aeroportos de Paris) ou a DNCS, que
montará aqui os submarinos comprados pelo Brasil à França, pertencem a
consórcios financiados com dinheiro público brasileiro. Essa é a mesma fonte
dos recursos que serão emprestados às multinacionais que vierem a participar
das concessões de aeroportos, de rodovias (com cinco anos de carência para
começar a pagar) e de ferrovias, incluindo o trem-bala Rio-São Paulo.
A Caixa
Econômica Federal, adquiriu, por sete mil reais, em julho, pequena empresa de
informática e depois nela se associou minoritariamente à IBM . No mês seguinte,
depois de constituída a nova sociedade, agora controlada pelos
norte-americanos, com ela celebrou, sem licitação, contrato de mais de um
bilhão e meio de reais - operação que se encontra em investigação pelo TCU.
Qual é o lucro
que o Estado brasileiro leva, financiando, direta e indiretamente, a entrada de
empresas estrangeiras de capital privado e estatal em nosso território para, em
troca, em lugar de reinvestirem os seus lucros por aqui, continuarem mandando
tudo o que podem para fora ?
Com a queda dos
juros no exterior por causa da crise e da recessão que assolam a Europa e o
Japão, existe liquidez bastante para que essas empresas busquem dinheiro lá
fora para bancar, pelo menos, a parte majoritária de seus investimentos no
Brasil.
Os chineses, por
exemplo, têm dinheiro suficiente para financiar tudo o que fizerem no Brasil,
sem tomar um centavo com o BNDES. Usar o banco para aumentar o conteúdo
nacional nos projetos é inteligente. Mas, se estamos financiando empresas
estatais estrangeiras, por que não podemos financiar nossas próprias estatais,
não apenas para diminuir a sangria bilionária, em dólares, para o exterior, mas
também para regular o mercado e os serviços prestados à população, como já
ocorre com os bancos públicos no mercado financeiro?
Não se trata de
expulsar ou discriminar o capital estrangeiro. Mas o bom sócio tem que trazer,
ao menos, know-how e dinheiro próprio. A China sempre tratou - até por uma
questão cultural - com superioridade quem quer investir lá dentro, e cresceu
quase dez por cento ao ano, nos últimos 20 anos, porque sempre entendeu ser o
mercado interno seu maior diferencial estratégico.
Aqui,
continuamos financiando a entrada de empresas estrangeiras com dinheiro
público, dando-lhes terrenos de graça, isentando-as de impostos, como se não
fôssemos a sétima economia do mundo.
O
desenvolvimento nacional tem que estar baseado no tripé capital estatal,
capital privado nacional, e capital estrangeiro. Nosso dinheiro, parco com
relação aos desafios que enfrentamos no contexto do crescimento da economia,
deve ser prioritariamente reservado para empresas de controle nacional, que,
caso sejam privadas, se comprometam a não se vender para a primeira
multinacional que aparecer na esquina. Quem vier de fora, que traga seu próprio
dinheiro, e o invista, preferivelmente, em novos negócios, que possam expandir
o número de empregos, a estrutura produtiva e aumentar a parcela de recursos
disponíveis para o investimento.”
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