Trump já montou o circo contra a democracia

 Descobre-se agora que a recusa de Donald Trump em reconhecer a derrota para Joe Biden nada tinha a ver com falta de modos, escreve Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia 

Via Brasil 247 -

 Por Paulo Moreira Leite, do Jornalistas pela Democracia

Mudanças promovidas nos últimos dias no primeiro escalão do governo Trump demonstram que está em curso uma operação política que pode consumar uma situação impensável num país onde o regime democrático nunca esteve seriamente ameaçado desde a independência, em 1776.
 
 A principal  mudança ocorreu na Secretaria da Defesa, onde Trump afastou Mark Esper, que se tornou personagem desprestigiado  na Casa Branca pela firmeza exibida durante os protestos contra a morte de
George Floyd asfixiado pelo joelho de um policial branco. Trump tentou de mobilizar tropas do militares para enfrentar as mobilizações de rua, mas Esper teve o bom senso de recusou a iniciativa.

Após a eleição, quando Joe Biden consumou uma vitória sem contestação no voto popular e no Colégio Eleitoral, e todos esperavam que Trump já estivesse fazendo as malas para voltar para a Trump Tower, o presidente deu o troco.
 
 Com mandato previsto para encerrar-se em 20 de janeiro, trocou Esper para instalar em seu lugar Cristopher Miller, um veterano das lutas subterraneas na guerra do Iraque, com um "magro currículo para o trabalho mas profunda experiência na luta contra o terrorismo", registrou o Washington Post, referindo-se a um universo  de comandolinha-dura e óbvio viés político.

No mesmo movimento, o procurador geral Willian Barr acaba de autorizar investigadores federais, em todo país, a apurar denúncias de irregularidades na eleição presidencial, iniciativa que só pode aumentar -- artificialmente -- a desconfiança diante do resultado. Barr não deve encontrar maior oposição, pelo menos no Senado. 
 
 Ali, onde os republicanos tem maioria, o líder Mitch McConnel apoia a investigação sem ressalvas -- acha que Trump tem "100% de direito" a isso. Na Câmara, onde os Democratadas tem maioria, a liderança republicana já fechou com o presidente.

Iniciativa que dá um ar de republica bananeira a uma das mais antigas democracias do planeta, a operação contra a soberania do povo norte-americano, manifesta em 3 de novembro, constitui uma aventura de resultado desconhecido.
 
A derrota de Trump foi reconhecida dentro e fora do país, inclusive por grandes grupos de comunicação que sempre se alinharam com seu governo. Com poucas excessões -- entre elas Bolsonaro --, Joe Biden já teve sua vitória reconhecida pela maioria dos países. Para além de uma gritaria previsível, Trump não apresentou nenhum fato concreto para justificar qualquer denúncia contra a votação.
 
 Não custa lembrar, contudo, outro fato preocupante. Com maioria republicana de 6 a 3, a Suprema Corte autorizou um sistema de contagem de votos que chama atenção -- separa aqueles depositados em urna e aqueles despachados pelo correio. Embora os votos pelo correio sejam uma tradição norte-americana desde a guerra civil, no século passado, nos Estados Unidos de 2020 essa distinção entre os votos pode ser um novo pretexto a favor de quem não aceita o resultado das urnas e quer virar o jogo no tapetão. Nessa hora, o ambiente de circo tende a ganhar importância, em prejuízo de qualquer avaliação serena sobre fatos e acusções.

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