Por que não será fácil para a Lava Jato alcançar o prazer sádico de transformar Lula em pombo-correio. Por Joaquim de Carvalho

Lula carregado pelo povo. Foto: RICARDO STUCKERT / IL
por Joaquim de Carvalho, DCM -

Deltan Dallagnol e sua turma não pedindo ou sugerindo que a Justiça conceda a Lula a progressão de regime de cumprimento da pena. Estão requerendo, ou seja, exigindo.

A jurista Sylvia Steiner, que foi procuradora da república e desembargadora, apontou o ineditismo da iniciativa.

“Nunca, nunca vi MP pedir, de oficio, progressão de regime. Nunquinha!”, disse ela, que foi também juíza do Tribunal Penal Internacional, em Haia.

Então por que os lavajeiros estão tão preocupados em assegurar esse direito a Lula?
A resposta pode ser encontrada no próprio requerimento assinado por Januário Paludo e seus catorze filhos, gente que considerou safadeza de Lula pedir para ir ao velório do irmão.

Na penúltima linha do requerimento (abaixo), a organização requer de Carolina Lebbos, da 12a. Vara Federal de Curitiba, que aplique a súmula vinculante número 56 do STF, que autoriza a colocação de tornozeleira eletrônica nos presos em regime semiaberto.

Lula, como se sabe, não aceita usar o equipamento.

“Tornozeleira é para ladrão e para pombo-correio. Eu não sou nem ladrão nem pombo-correio. Vamos deixar claro isso. Se o cidadão é safado, é ladrão, é corrupto, se ele roubou, ele pode colocar até uma pescoceira. Mas não venham colocar uma tornozeleira em um homem honesto que eu não aceito”, disse o ex-presidente, na entrevista ao DCM.

Diante da iminência de Lula deixar a prisão com a anulação do processo sobre o triplex, a Lava Jato quer impor ao ex-presidente a derradeira humilhação, como fez em março de 2016, ao impor a a ele a condução coercitiva.

Ou como tentou fazer há algumas semanas, quando requereu a transferência dele para um presídio comum em São Paulo.

Como daquela vez, não será tão simples para os lavajateiros alcançar o prazer jurídico do sadismo processual.

O criminalista Marco Aurélio Carvalho entende que o caso pode parar o STF, a única instância do Judiciária que tem barrado os abusos da Lava Jato.

“Lula não é obrigado a aceitar a progressão de regime se forem impostas a ele condições que não sejam razoáveis”, afirmou, em entrevista ao DCM.

“A progressão de regime, com o cumprimento de um sexto de pena, em circunstâncias normais, não impõe, salvo específicas circunstâncias, o gravame de uma tornozeleira eletrônica ou coisa do gênero”, acrescentou.

Em razão disso, Lula pode não querer progredir de regime de cumprimento de pena. Seria uma situação inédita no Judiciário.

“Não temos nenhum precedente em relação a isso. O correto seria que ele fosse colocado em liberdade de forma imediata e incondicionada. Ele não oferece risco nenhum à ordem pública, uma pessoa com endereço conhecido, publicamente conhecida nacional e internacionalmente”, comentou.
Se Carolina Lebbos atender ao requerimento do MPF, o que é provável, considerando os antecedentes, a defesa de Lula poderá pedir ao STF medida idêntica a que foi concedida ao ex-ministro Guido Mantega.

O ex-ministro conseguiu impedir a colocação de tornozeleira eletrônica com o argumento de que, sendo figura pública, poderia sofrer constrangimento, com o risco de hostilização.

Outro alvo da Lava Jato, o deputado Eduardo da Fonte, do PP de Pernambuco, também conseguiu evitar a tornozeleira eletrônica.

Prestes a completar 74 anos de idade, Lula enfrenta a prisão com a certeza de que seu cárcere é a evidência de que o Brasil não vive em um estado de plenitude democrática.
Ele já disse a interlocutores:

“Com base em mentiras, eles criaram um situação da qual não sabem agora como sair. Esse pedido é para resolver um problema deles, não meu”.

Isso não quer dizer que Lula já decidiu não aceitar a progressão de regime. Há um fator familiar que pesa em sua decisão: a noiva, os filhos e os netos querem conviver mais com ele, e a prisão domiciliar permitiria o maior convívio.

Não é uma situação fácil para o ex-presidente, mas, como tem demonstrado desde que surgiu na esfera pública como dirigente sindical, Lula colocou sua vida a serviço de uma causa.

Não é messianismo, mas vocação política, algo que lavajeteiros e bolsominions jamais compreenderão.

Como líder de um projeto que dá voz a pobres, ele não pode passar a imagem de que está trocando sua dignidade por liberdade.

Com tornozeleira eletrônica, então, nem pensar.

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