Luis Nassif, GGN
Nesses
movimentos de catarse, o roteiro é definido ex-post. Não existe
narrativa pronta e acabada. Abre-se a caixa de Pandora, os gnomos da
política se espalham, montam-se nuvens por todos os lados, que vão
adquirindo formatos diversos, se juntando aqui e acolã. Mas só depois se
tem a resultante final.
Esse
quadro intrinsicamente caótico é potencializado pelo fim do monopólio
da velha mídia, pelas redes sociais implodindo a narrativa convencional.
Pois se trata de uma guerra de informações e de formação de opinião.
Nos últimos dias, os seguintes movimentos começaram a ganhar força:
1.
A incapacidade e impopularidade de Dilma Rousseff são um dado da
realidade, com o que contavam os golpistas. Colocaram o bloco na rua
julgando que a presidente cairia por gravidade. Para sua surpresa,
despertaram um valor muito maior, mais legítimo e mais abrangente: a
defesa da legalidade. Esse tema colocou em movimento a grande frente
formada por juristas, intelectuais de várias áreas, personalidades
artísticas e midiáticas, movimentos sociais, políticos independentes. A
beleza do tema fez o movimento se despregar do peso de Dilma e do
próprio PT.
2.
O desmanche acelerado da imagem de Michel Temer. Hoje, em O Globo,
Temer passa recibo sobre os danos de imagem que sofreu desde a malfadada
carta enviada a Dilma. Em poucos dias, a imagem do político mediador,
do grande jurista rolou ladeira abaixo e voltou a do parlamentar que
pavimentou sua carreira como o mais legítimo representante da política
mais anacrônica: o que recorre apenas às indicações de apaniguados para
cargos públicos. É só conferir seu papel nos tempos em que o Congresso
dispunha de uma elite que conduzia o baixo clero. Jamais atuou como
agente catalizador das boas ideias.
Setores
formadores de opinião deram-se conta que a Ponte Para o Futuro - o
plano econômico de Temer - era uma gambiarra de última hora, não uma
bandeira de toda a vida. Os ataques de Renan Calheiros ajudaram no
desmanche ao revelar que a) Temer não é unanimidade nem no partido que
preside; b) em todo esse tempo de vice-presidente, só batalhou por
cargos, jamais por propostas.
Temer deixou de ser pule de dez.
3.
As apostas do PSDB na terra arrasada, destruindo a imagem de agente
mediador entre a velha política e as forças modernizantes, que detinha
na transição do governo Collor. Tornou-se um DEM sem a credibilidade
junto ao seu novo eleitorado.
São três formações de nuvens que ganham consistência e atuam como forças anti-golpe.
Mas persistem fatores estimuladores do golpe.
O
principal deles é a baixíssima confiança na capacidade de Dilma de
reconstruir seu governo, em caso de se abortar o impeachment.
A
saída de Joaquim Levy poderá ser o caminho para o golpe final na tese
do impeachment - ou para alimentar ainda mais a fogueira.
Se
o indicado para o cargo for pessoa de largo trânsito - inclusive no
mundo político - e com poderes de primeiro ministro, acenando com um
discurso anti-crise, anti-pessimismo, conseguirá o que parecia
impossível: a terceira chance para o governo Dilma. Ganharia fôlego para
derrotar de vez as manobras golpistas, permitindo mais à frente Dilma
renascer das cinzas com uma reforma ministerial de peso.
No fundo, a solução da crise está em Dilma. E a grande incógnita do jogo continua sendo a capacidade de discernimento de Dilma.
Comentários