Luis Nassif, GGN
"Não há nenhum apuro técnico nesse festival de denúncias bancado pela mídia.
Valem-se de um recurso que descrevo em meu livro "O jornalismo dos anos 90"., fartamente praticado pela revista Veja.
Juntam-se alguns pontos verdadeiros -
porém irrelevantes - e com base neles desenham uma história muito mais
ampla, na qual os pontos relevantes são meras suposições, que não vêm
acompanhada de fatos.
É o caso da tal "denúncia" do Estadão
sobre o lobby junto à Casa Civil para estender os benefícios da redução
do IPI às empresas Hyundai e CAOA.
O que diz a matéria do Estadão:
A manchete, parte principal da matéria,
aquela em que o rigor jornalístico tem que ser redobrado, afirma que
Medida Provisória "teria sido" comprada.
Na reportagem, fica-se sabendo de que
um tal Mauro Marcondes "teria" acertado o pagamento de R$ 4 milhões a
alguém do PT. Mas não teria revelado o nome de ninguém que teria
recebido a propina.
A matéria diz que um dos escritórios
repassou R$ 2,4 milhões a um filho de Lula. Assim, parágrafo solto, sem
nenhuma informação adicional que corrobore a acusação, sem investigações
adicionais nem nada.
Aí aparece alguém no dossiê dizendo que nada foi pago e que era golpe do Mauro Marcondes para desviar dinheiro.
Na sequência, constata-se que, quando
percebeu que estava sendo vítima do golpe, a CAOA pulou do barco e
também não pagou nada. E o escritório ameaçou divulgar gravações das
conversas entre eles.
Por fim, o grande elo perdido: um dos lobista seria Alexandre Paes Santos, supostamente ligado à Erenice Guerra.
Alexandre, ou APS, era ligado à revista
Veja, tal qual Carlinhos Cachoeira. Usava a revista para espalhar
dossiês contra adversários de seus clientes.
No fundo, o que se tem é a história de
um espertalhão que tentou passar a perna na CAOA vendendo lobby em favor
de uma MP que seria aprovada. Descoberto o golpe, e os desvios de
dinheiro, as empresas pularam fora.
A única empresa que acreditou no espertalhão foi o Estadão.
Do Estadão
Empresas negociaram pagamento de até R$
36 milhões a lobistas para conseguir da Casa Civil um 'ato normativo'
que prorrogou incentivos fiscais de R$ 1,3 bilhão
Documentos obtidos pelo Estado indicam
que uma medida provisória editada em 2009 pelo governo do então
presidente Luiz Inácio Lula da Silva teria sido “comprada” por meio de
lobby e de corrupção para favorecer montadoras de veículos. Empresas do
setor negociaram pagamentos de até R$ 36 milhões a lobistas para
conseguir do Executivo um “ato normativo” que prorrogasse incentivos
fiscais de R$ 1,3 bilhão por ano. Mensagens trocadas entre os envolvidos
mencionam a oferta de propina a agentes públicos para viabilizar o
texto, em vigor até o fim deste ano.
Para ser publicada, a MP passou pelo
crivo da presidente Dilma Rousseff, então ministra da Casa Civil.
Anotações de um dos envolvidos no esquema descrevem também uma reunião
com o então ministro Gilberto Carvalho para tratar da norma, quatro dias
antes de o texto ser editado. Um dos escritórios que atuaram para
viabilizar a medida fez repasses de R$ 2,4 milhões a um filho do
expresidente Lula, o empresário Luís Cláudio Lula da Silva, em 2011,
ano em que a MP entrou em vigor.
O roteiro para influenciar as políticas
de desoneração do governo e emplacar a MP é descrito em contratos de
lobby pactuados antes da edição da norma. Conforme os documentos, a MMC
Automotores, subsidiária da Mitsubishi no Brasil, e o Grupo CAOA
(fabricante de veículos Hyundai e revendedora das marcas Ford, Hyundai e
Subaru) pagariam honorários a um “consórcio” formado pelos escritórios
SGR Consultoria Empresarial, do advogado José Ricardo da Silva, e
Marcondes & Mautoni Empreendimentos, do empresário Mauro Marcondes
Machado, para obter a extensão das benesses fiscais por ao menos cinco
anos. Os incentivos expirariam em 31 de dezembro de 2010, caso não
fossem prorrogados.
IPI. Os contratos obtidos pelo Estado
datam de 11 e 19 de novembro de 2009. No dia 20 daquele mês, o
expresidente Lula assinou a MP 471, esticando de 2011 até 2015 a
política de descontos no IPI de carros produzidos nas três regiões
(Norte, Nordeste e Centro-Oeste). À época, a Ford tinha uma fábrica na
Bahia e CAOA e Mitsubishi fábricas em Goiás. A norma corresponde ao que
era pleiteado nos documentos. Em março do ano seguinte, o Congresso
aprovou o texto, convertendoo na Lei 12.218/2010. Suspeitas de
corrupção para viabilizar a medida provisória surgiram em emails
trocados por envolvidos no caso.
Uma das mensagens, de 15 de outubro de
2010, diz que houve “acordo para aprovação da MP 471” e que Mauro
Marcondes pactuou a entrega de R$ 4 milhões a “pessoas do governo, PT”,
mas faltou com o compromisso. Além disso, o texto sugere a participação
de “deputados e senadores” nas negociações. Não há, no entanto, menção a
nomes dos agentes públicos supostamente envolvidos.
Acordo. O email diz que a negociação
costurada por representantes das empresas de lobby viabilizou a MP 471. O
remetente – que se identifica como “Raimundo Lima”, mas cujo verdadeiro
nome é mantido sob sigilo – pede que o sóciofundador da MMC no Brasil,
Eduardo Sousa Ramos, interceda junto à CAOA para que ela retome
pagamentos.
Diferentemente da representante da
Mitsubishi no Brasil, a CAOA teria participado do acerto, mas recuado na
hora de fazer pagamentos. Um dos lobistas não teria repassado dinheiro a
outros envolvidos.“Este (Mauro Marcondes Machado) vem desviando
recursos, os quais não vêm chegando às pessoas devidas (...) Comunico ao
senhor do acordo fechado para a aprovação da MP 471, valor este do seu
conhecimento. (...) o sr. Mauro Marcondes alega ter entregado a pessoas
do atual governo, PT, a quantia de R$ 4 milhões, o qual (sic) não é
verdade”, alega.
A mensagem, intitulada “Eduardo Sousa
Ramos (confidencial)” foi enviada às 16h54 por “Raimundo” à secretária
do executivo da MMC, Lilian Pina, que a repassou a Marcondes meia hora
depois. O remetente escreve que, se o dinheiro não fluísse, poderia
expor um dossiê e gravações com detalhes das tratativas. “A forma de
denúncia a ser utilizada serão as gravações pelas vezes em que estive
com Mauro Marcondes, Carlos Alberto e Anuar”, avisa, referindose a
empresários da CAOA. “Dou até o dia 21 para que me seja repassada a
quantia de US$ 1,5 milhão”, ameaça.
Os dois escritórios de consultoria
confirmam ter atuado para emplacar a MP 471, mas negam que o trabalho
envolvesse lobby ou pagamento de propina.
Ambos são investigados por atuar para as
montadoras no esquema de corrupção no Carf. A MMC e a CAOA informam ter
contratado a Marcondes & Mautoni, mas negam que o objetivo fosse a
“compra” da Medida Provisória. Dono da SGR, José Ricardo era parceiro de
negócios do lobista Alexandre Paes dos Santos, ligado à advogada
Erenice Guerra, secretária executiva de Dilma na Casa Civil quando a MP
foi discutida. Marcondes é vicepresidente da Anfavea, na qual
representa a MMC e a CAOA.
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