Luis Nassif, GGN
O jovem repórter de economia me escreve desanimado. É uma das
grandes revelações do jovem jornalismo responsável. Meticuloso na
apuração, cuidadoso nas deduções, tem o compromisso da informação
correta em primeiro lugar.
Ontem, com os mercados ainda abertos, a seção Radar, de Veja, solta
a nota irresponsável: "Levi redigiu cartão de demissão e se reunirá com
Dilma". O mercado explode, as redações enlouquecem, saem todos à cata
da confirmação da notícia.
Levy chega de uma reunião com Dilma às 17:58 e entra no elevador
do Ministério, denotando enorme irritação. Seus assessores informam que
está irritado com as pressões de Lula e do PT contra o ajuste fiscal,
mas apenas isso. Não escreveu carta nenhuma e nem pensa em demissão.
Nem bem chega no seu gabinete e a mesma seção Radar solta outra
nota - agora com os mercados já fechados: "Levy não entrega carta e
permanece no cargo, mesmo insatisfeito". Como se a primeira nota não
fosse de sua autoria.
Para não ficar para trás, outros colunistas embarcam na onda e alimentam o caldeirão de boatos.
***
Voltemos ao jovem repórter: "Jornalismo não pode ser isso. Notas de
dois parágrafos, uma atrás da outra, com informações desencontradas,
falando a interesses de cada fonte".
A malícia desse jornalismo fast food consiste em transformar em
fato o boato que é meramente verossímil. Levy está insatisfeito? Sim.
Pode sair? Pode. É o que basta para transformar o verossímil em fato
acabado. Afinal, um dia aquela notícia ainda será verdadeira.
Daí o desabafo: "Você passa horas, dias em cima de coisas
complexas, sofrendo pressão de todos os lados, para conseguir um pé de
página. E essa turminha do jornalismo de notas fast food ou das colunas
idênticas fica desfilando boatos sem nenhum esforço de apuração".
***
No mesmo dia, a coluna de Lauro Jardim em O Globo solta o boato de
que o lobista Fernando Baiano - operador do PMDB - teria pago R$ 2
milhões para que um pecuarista amigo de Lula ajudasse a pagar as dívidas
imobiliárias de uma nora de Lula.
Quando, onde, como e por quê não interessa. Não interessa sequer o
nome da nora de Lula. Uma informação que. partindo de um jornalismo
responsável, mudaria o curso da história, é transformado em uma nota de
três linhas.
Logo depois, outra nota afirmando que, basta conhecer a família de
Lula para saber que a nora só poderia ser a esposa do Lulinha. Assim:
ataque à honra de uma pessoa baseada nessa acurada apuração.
***
Fernando Baiano ficou meses sem aderir à delação premiada. No mesmo
momento em que se fixa o dia para sua libertação, oferece a
contrapartida que a Lava Jato solicita: qualquer coisa que envolva Lula e
que não precise de comprovação futura, inclusive para não comprometer a
validade da delação.
Afinal, será a palavra dele contra a do pecuarista. A informação
não se transformará em inquérito, por ausência de provas, mas não
comprometerá a delação. Afinal, os procuradores levam a sério o seu
trabalho. E seu trabalho são apenas os inquéritos e processos na forma
de lei. Se os colunistas não levam a sério o seu trabalho, problema
deles e dos jornalistas que, trabalhando seriamente, assistem o
jornalismo soçobrar."
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