Governo deve ficar ao lado do povo, não do Congresso

Hélio Doyle, Blog: Hélio Doyle

"Muita gente achava que uma das consequências das manifestações de rua de junho de 2013 seria uma mudança de peso nas práticas políticas. Naquele momento, e pesquisas mostraram isso, boa parcela da população estava dando um recado claro: vocês, governo e políticos, não nos representam. Estava colocada em xeque a representatividade das instituições políticas e de seus atores.

O que vinha acontecendo no mundo parecia dar respaldo a essa expectativa de renovação. Os indignados na Espanha, o Occupy Wall Street, movimentos de protesto em diversos países sob a bandeira da reação às políticas de austeridade impostas pelo poder econômico e da mudança radical dos métodos de fazer política. Surgiram o Podemos na Espanha, o Syriza na Grécia. Enfim, dizia-se claramente que havia uma crise de representatividade política em vários países.

No Brasil, porém, nada aconteceu. A ação violenta de black blocs afastou muita gente das ruas, as manifestações acabaram ou ficaram restritas a pequenos grupos e assim os políticos puderam ignorar o sentimento de mudança e continuar com seus velhos métodos. As eleições de 2014 se deram nas mesmas circunstâncias das anteriores: forte presença do poder econômico, legal ou ilegalmente; táticas marqueteiras, bem ou mal sucedidas, fundadas na enganação e na ilusão; e discursos vazios e inconsistentes dos candidatos.

A agressividade da campanha no primeiro turno, especialmente quando se via o favoritismo de Marina Silva, e a polarização da campanha quando Dilma e Aécio ficaram frente a frente, continuam até hoje. Juntaram-se diversos fatores para levar a população ao enorme descontentamento que existe hoje: a crise econômica e financeira, escondida durante a campanha; as denúncias de corrupção, envolvendo pessoas ligadas a partidos governistas e ao próprio governo; o conservadorismo de elites descontentes com a perspectiva de mais quatro anos de governo petista. Os líderes oposicionistas, especialmente os tucanos, aproveitaram desse caldo para acirrar o clima político, impedir a superação da crise, inviabilizar o governo e promover sua derrubada, por impeachment ou renúncia da presidente.

Criou-se, assim, a ideia de que se o governo for derrubado tudo estará resolvido – a crise será superada com medidas que não prejudicarão a população e a corrupção acabará. Qualquer um que acompanhe a política brasileira sabe que não acontecerá nem uma coisa nem outra, é puro estelionato. Em um governo com hegemonia do PMDB e dos tucanos, a crise será enfrentada nos moldes neoliberais e conservadores, e a corrupção aumentará em progressão geométrica.

Grande parte da população, porém, insuflada pelo sectarismo dos líderes tucanos, da direita e dos fascistas que saíram do armário, em uma perfeita aliança antidemocrática, está acreditando nisso. O governo e seus aliados, hoje minoritários na sociedade, não estão sabendo confrontar esses adversários. A dificuldade começa na falta de unidade, especialmente por causa da natureza do ajuste fiscal que o governo promove, continua numa sucessão inacreditável (e inadmissível) de erros de estratégia e de ação política e se torna mais grave porque os defensores do mandato de Dilma optaram por combater os adversários com os métodos da velha política – deixando, a eles, a argumentação de que representam aquela renovação pregada nas manifestações de 2013 e que ainda permanece em grande parte da população.

Os que querem derrubar Dilma representam a velha e a velhíssima política, são o que há de pior na política brasileira, mas capitalizam o descontentamento das pessoas que estão saturadas da corrupção e das velhas práticas. Até porque, tendo como aliados também alguns dos piores e mais corruptos quadros políticos do país, o governo insiste justamente nas velhas práticas, como o loteamento de ministérios e cargos, para tentar evitar ser derrubado. Cooptando parlamentares na base do toma lá dá cá pode até impedir que a oposição tenha os votos para o impeachment, mas continuará perdendo a opinião pública. E se o descontentamento se radicalizar mais, os parlamentares mandarão as benesses às favas e derrubarão o governo.

Os estrategistas do governo não estão entendendo o quadro em sua profundidade e concentram seus esforços em salvar o mandato, acreditando na barganha com parlamentares como a solução. Acontece que, no Congresso fortalecido pelo enfraquecimento do Executivo, agrada-se a alguns e desagrada-se a muitos. E os cofres dos parlamentares não têm fundo.
A saída para o governo é trazer o povo para seu lado, não o Congresso."

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