Fernando Brito, Tijolaço
Para matar de vergonha os “arautos da moralidade” que silenciam diante da imoralidade do projeto que consagra as doações empresariais para campanhas eleitorais, que só se viabilizou porque Gilmar Mendes sentou-se por um ano e meio sobre a decisão de proibi-lo, como já decidira o Supremo Tribunal Federal, não é preciso que algum blog de esquerda escreva sobre isso.
Basta a leitura do ótimo e corajoso comentário do correto José Roberto de Toledo sobre o projeto enfiado, goela abaixo da Nação, pelas repetidas votações promovidas por Eduardo Cunha. Enquanto Gilmar Mendes fica dizendo que a proibição das doações privadas vai criar o “caixa 2 da compra de CPFs falsos”, um delírio que o simples cruzameto dos dados eleitorais com os da Receita desmontaria, a certeza da corrupção generalizada vem justamente do contrário, da regra aprovada na Câmara de “doar bem sem dizer a quem”.
Leia a explanação mais do que clara de Toledo:
“Enquanto todos os olhares se
voltavam à perda do grau de investimento do País, a Câmara dos Deputados
aprovava na correria de sempre, no mesmo dia e na mesma hora, uma
reforma eleitoral cujo texto e extensão só se conheceram depois de
consumada a votação. Os deputados oficializaram o obscurantismo.
Graças à reportagem de Daniel
Bramatti, sabe-se agora que a Câmara, entre outros retrocessos, tornou
legal a lavagem das doações ocultas de campanha. Transformou em lei o
que era um truque, um jeitinho. A partir das próximas eleições, não será
mais possível saber, por exemplo, que o presidente da Câmara, Eduardo
Cunha (PMDB-RJ), elegeuse com dinheiro da Ambev, da Rima Industrial e
da Telemont Engenharia. Ou que o relator da reforma, Rodrigo Maia
(DEM-RJ), foi apadrinhado pelo banco BMG.
A nova legislação proíbe a doação
direta de empresas a candidatos. A partir de agora, a pessoa jurídica
que quiser investir na política terá de, obrigatoriamente, pagar pedágio
para o partido. Todo o dinheiro doado passará por seus comitês
financeiros. De lá, seguirá lavadinho e anônimo para os políticos. Na
prestação de contas do candidato só aparecerá que o dinheiro veio do seu
partido. E, na do partido, que ele deu tanto para o candidato, sem
declarar o nome do doador original.
A mudança está no 12.º parágrafo do
artigo 28 da nova lei: “Os valores transferidos pelos partidos políticos
oriundos de doações serão registrados na prestação de contas dos
candidatos como transferência dos partidos e, na prestação de contas dos
partidos, como transferência aos candidatos, sem individualização dos
doadores”.
O efeito prático da reforma
obscurantista aprovada com o voto de mais de 300 deputados é que: 1) a
empresa saberá se a quantia que doou foi a mesma que o candidato que ela
pretendia financiar recebeu, 2) o partido saberá de quem recebeu o
dinheiro e para quem repassou essa grana, 3) o candidato saberá quanto
recebeu do partido e poderá conferir com o empresário doador se o valor
bate. Mas o eleitor e a Justiça eleitoral não saberão mais qual empresa
financiou qual candidato. A sociedade ficará no escuro.
Essa mudança fundamental da
legislação poupa os políticos do constrangimento de o público ficar
sabendo que são financiados pela indústria de armas, ou que fazem parte
da bancada do bife (financiada pelo frigorífico JBS), da cerveja, das
mineradoras, das empreiteiras, dos bancos, das seguradoras – e por aí
vai.
Para os financiadores, também é
conveniente porque fica mais difícil de estabelecer uma ligação direta
entre a empresa e um ou mais políticos. Assim, quando esse político
assinar um contrato com aquela empresa, aprovar uma lei que a beneficie,
barrar uma convocação de seu dono para depor em uma CPI, ninguém poderá
afirmar com certeza que ele está retribuindo o favor pelo dinheiro que
recebeu da empresa durante a campanha eleitoral.”
Pelo grau de desfaçatez dos “moralizadores”, sabe-se da hipocrisia de sua “moralidade”.
Comentários