A altissonância da irrelevância. Ou o jornalismo sem fatos


Fernando Brito, Tijolaço 

"O mau-humor da Presidente Dilma Rousseff, que não é raro em pessoas cheias do que fazer que são atrapalhadas pela incompetência de quem não tem outro afazer senão aquele que faz mal feito, consegue ser superado pelo mau-humor da Folha, procurando sempre demonstrar que ela é uma pessoa irascível, intratável.

Agora, o jornal paulista destaca que “Dilma se irrita com cerimonial após ser barrada em evento no Planalto“, narrando que “um dos cerimonialistas a impediu de prosseguir. Com as duas mãos estendidas junto à presidente, pediu que ela esperasse a passagem dos atletas cadeirantes, que haviam recebido os cumprimentos de Dilma momentos antes, em um salão anexo”.

E aí, a reação : “foi o suficiente para a presidente fechar o cenho e discutir com o funcionário. Gesticulava, balançava negativamente a cabeça e dizia que o evento precisava ter sido melhor (sic) organizado”.

Francamente, o que era para Dilma fazer? Dizer, “sim, senhor” a um “cerimonialista” que, sem a menor cerimônia, estende as duas mãos e impede a passagem da Presidenta da República em pleno Palácio do Planalto?

Se a Presidenta, por acaso, resolver sair do tablado e cumprimentar alguém na platéia, o cerimonialista vai barrá-la? Se quiser pegar um cadeirante e empurrar sua cadeira, ele vai impedi-la, porque “não está previsto no cerimonial”?

Isso é assunto de noticiário político, com chamada de primeira página? Mal e porcamente de uma notinha pitoresca nas colunas, e olhe lá.

Mas é preciso apresentar Dilma como uma pessoa intratável, não é verdade?
O cerimonialista que faça bem o seu trabalho, como a reportagem da Folha deveria fazê-lo e suporte as repreensões pelos erros que, afinal, todo ser humano comete.

Até a repórter, que escreve “melhor” no lugar de “mais bem” -porque melhor é superlativo de “bom” e não de “bem” –  e ainda tasca um sonoro AUTO-falante no final da matéria.

Será que o editor pode franzir o cenho e balançar a cabeça com a falha profissional na redação?

Todo mundo erra e o erro pode merecer repreensão. Eu erro muito, péssimo digitador que sou e escrevinhador de frases longas, cujo final frequentemente “se esquece” do início. Se me corrigem, humildemente agradeço.

Agora, transformar isso em campanha sobre o “descontrole”  da Presidenta, perdoem, mas é prezar muito pouco o papel de informar do jornalista.
Nem mesmo sequer há menção ao fato de  de que 78% dos atletas olímpicos e paraolímpicos que defenderam o Brasil no Canadá recebiam apoio do governo, em geral pelo Bolsa-Atleta.

Quando algo irrelevante é transformado em acontecimento é sinal de que as intenções e não os fatos assumiram o papel do jornalismo."

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