Alberto Dines, Observatório da Imprensa
A 14 ª fase da Operação Lava Jato
deveria chamar-se Operação Apocalipse, mas o comando da força-tarefa
preferiu a citação latina, mais edificante, Erga Omnes, “contra todos” – perante a lei não há privilégios.
Mas a imprensa – sobretudo a
hebdomadária – sempre agarrada à possibilidade de grandes emoções e
trepidações, preferiu enxergar na prisão dos presidentes da Odebrecht e
Andrade Gutierrez (as duas maiores empreiteiras do país com obras nos
quatro cantos do mundo), uma espécie de fim do mundo.
Na capa da Veja a seguinte chamada:
>> “A Queda do Príncipe dos
Empreiteiros – A prisão de Marcelo Odebrecht leva a investigação do
escândalo da Petrobrás ao patamar mais alto do poder na era Lula”
Na capa da concorrente, Época, o mesmo Marcelo Odebrecht em foto sombria, preto & branco, clima cataclísmico:
>> “Ele ameaça derrubar a
República – A força-tarefa prende Marcelo Odebrecht, uma empresa que
explodiu em faturamento na era Lula”
CartaCapital, que fecha às
quintas-feiras, evidentemente não conseguiu noticiar uma fato que
ocorreu horas depois, na manhã da sexta-feira. Lástima: seria
interessante comparar a sua entonação com as dos outros semanários.
Certamente seria mais contida, menos histérica, sem aquela aposta de fim
dos tempos.
Na apresentação de Veja, a ilusão de que a Polícia Federal está a um passo de prender o ex-presidente Lula. Na de Época,
o suposto desafio dos Odebrecht ao governo: “Terão de construir três
celas” (uma para o pai e antecessor de Marcelo, Emílio, outra para Lula e
a terceira para Dilma).
Sem fôlego
Este é o estado do nosso jornalismo
contemporâneo escancarado, sem inibições, por duas das maiores empresas
de mídia brasileiras (Grupo Globo e Abril): no lugar de fatos e
respectivas implicações, fantasias e inferências. Em vez de evidências e
comprovações, conjecturas delirantes. A grande mídia quer porque quer
pegar o ex-presidente Lula e não perde uma oportunidade para fomentar a
imaginação dos seus leitores.
O governo Dilma não pode estar por trás
do cerco da força-tarefa às grandes empreiteiras como as reportagens
tentam evidenciar, a não ser que estivesse dominado por um surto
suicida. Ao contrário, o governo prefere que as investigações fiquem
circunscritas à esfera da Petrobras de modo que as empreiteiras possam
continuar operando em outros projetos e obras sem engrossar a crise
econômica.
A Operação Lava Jato está em curso há
cerca de 460 dias e os nossos jornalistas investigativos ainda não
conseguiram perceber que, desta vez, as investigações que contam e
produzem resultados são as empreendidas pelo Estado, alheias ao
voluntarismo dos grupos de mídia.
A imprensa está a reboque dos eventos,
sem fôlego sequer para produzir balanços; e assim ficará, exangue e
inapetente, enquanto seus paradigmas e doutrinas continuarem ditados
pelas redes sociais."
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