"PT e
PSDB estão envelhecidos, mas ainda são os dutos de comunicação das bases
oposicionistas e governistas com o poder institucional.
Maria Inês Nassif, Carta Maior
O sistema político brasileiro vive grandes
impasses. A sociedade radicalizou posições políticas e esticou a corda
da disputa ideológica na sua base social no limite, sem encontrar dutos
institucionais para transformar essa luta em poder político de forma
equilibrada. Os veículos definidos pela democracia brasileira como os
apropriados para transformar hegemonias sociais em poder político estão
esgarçados. A conversa entre instituições e luta política está muito
difícil.
O
que acontece hoje é que a polarização da sociedade encontra, no
oposicionismo, apenas a direita conservadora, e partidos que não dispõem
de quadros de qualidade na política institucional. A oposição hoje
grita muito e bate muita panela, mas não consegue sair da
camisa-de-força que submete todos os que não concordam com o governo de
esquerda ao discurso conservador, e ao ônus de assumir uma agenda eivada
do moralismo próprio e tradicional da direita – família, pátria e
religião. Presa nesses estereótipos, nem o próprio conservadorismo
consegue formular um projeto próprio de poder. O projeto é o discurso
moral; o objetivo é o poder imediato, sem obediência a regras como o
voto e o mandato legítimo. Além do discurso, reina o nada. O livre
mercado acaba resolvendo tudo na cabeça desse setor social porque não
existe nada a se propor para o futuro, a não ser a liberdade de fazer
negócios.
No
governismo, a esquerda assiste estupefata a perda de espaço para a
direita e não consegue encontrar na vida institucional um organismo
político com vocação para a hegemonia como era o PT do passado. O PT
vive profundo desgaste, mas é risível imaginar que qualquer outra força
política nesse campo ideológico tenha condições de assumir o papel
central e a direção dessas forças políticas.
Desde
2005, quando estourou o chamado Escândalo do Mensalão, o PT acreditou
que resolveria a disputa política apenas no voto, contando com a
popularidade de um grande líder político, Luiz Inácio Lula da Silva, e a
simpatia automática de beneficiados com os programas sociais dos
governos petistas. Nunca entendeu o desgaste cumulativo a que estava
submetido por uma campanha sistemática para torná-lo sinônimo de
corrupção e incompetência.
A
reação do partido a denúncias, algumas incorretas, outras corretas, não
foi eficiente: às denúncias incorretas, não foi capaz de contrapor
respostas que fossem ouvidas por um eleitorado que ascendia à classe
média e por jovens que cresceram já numa realidade de maiores
oportunidade; às denúncias corretas, não deu respostas claras que
indicassem correções na condução do partido. Em ambos os casos, não foi
ajudado por uma situação real de hegemonia da mídia conservadora, mas o
fato é que não construiu nada que se contrapusesse a essa realidade.
Acrescente-se
a isso uma crescente queda na qualidade de seus quadros, em parte por
erros na condução do partido, em parte por ceder a regras eleitorais que
o tornaram refém de financiamento privado vindo de fora, o que abriu
muito espaço político para quadros não qualificados e reduziu o poder
interno de grupos mais qualificados.
Os
protagonistas partidários da polarização social, mais por necessidade
de partidos para disputar eleição do que propriamente pela qualidade
delas, continuam o PT e o PSDB. E o que acontece hoje com as duas
agremiações políticas, por razões diferentes, acaba tendo muitas
semelhanças.
O
PSDB, já constituído como partido de quadros e sem dinâmica interna
para formar novos, aderiu à lógica da cooptação dos partidos
tradicionais e incorporou atores vindos de outras legendas com vocação
conservadora. O surfe na onda ideológica do neoliberalismo no governo
FHC, no que foi o mais organizado momento de confluência das forças
conservadoras – uma avalanche ideológica capaz de sustentar um amplo
programa de privatizações, redução de Estado e restrição de direito
sociais –, levou os antigos líderes para o conservadorismo quando o
partido já não era capaz de formar quadros novos que resistissem a essa
guinada.
Simultaneamente,
o PT, desde as duas últimas eleições presidenciais antes de sua
vitória, em 2002, com Lula, veio abrindo mão de sua vocação como partido
de massas e encontrou conforto na burocracia partidária quando passou a
ser atacada impiedosamente por adversários. Ao deixar amornar a vida
interna do partido, e perder quadros primeiramente para o governo, e
depois em escândalos justos e injustos, perdeu também a sua capacidade
de formação de quadros.
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