Depressão cívica: qual é a utopia, o que faremos?


Ricardo Kotscho, Balaio do Kotscho

"O que nós, eu e você, sem utopias, podemos fazer para realmente começar a mudar este cenário?"

Quem me mandou esta pergunta foi o jovem leitor Thiago André, de 20 anos, em comentário publicado às 14h01 de terça-feira, a respeito do post anterior "Aonde isso vai parar?", pergunta mestre de Dilma".

Como muita gente está se fazendo as mesmas perguntas neste momento difícil e nebuloso que estamos vivendo, repasso-as aos demais leitores para que, pensando juntos, possamos encontrar as respostas, em vez de ficarmos aqui só fazendo sempre os mesmos diagnósticos assustadores sobre a crise, sem sair do lugar, sem apontar caminhos, sem buscar novas utopias.

Alguns amigos já estão fazendo isso. Em artigo divulgado no mesmo dia, sob o título "Depressão cívica", Frei Betto levantou algumas questões:

"Perante o desgaste dos partidos, surgem propostas de formar frentes suprapartidárias, congregando militantes de diferentes partidos e movimentos sociais. Rumo a quê? Qual a proposta capaz de aglutinar distintos segmentos da nação? Apenas evitar a retomada do poder central pela direita?"

E arriscou apontar possíveis caminhos:

"Ora, isso já se fez na reeleição de Dilma. Sem um projeto histórico capaz de encarnar princípios éticos inquestionáveis, reorganizar a esperança das bases populares e sinalizar efetivas mudanças estruturais, não creio que haveremos de enxergar luz no fim do túnel".

Já fizemos isso juntos no passado, ao nos mobilizarmos nos movimentos pela Anistia, pelas eleições diretas e pela Constituinte, quando estes projetos históricos também não passavam de utopias, em que no início poucos acreditavam.

A grande diferença é que, naquele tempo, nos estertores da ditadura militar, tínhamos no país grandes lideranças, mais à esquerda ou à direita do espectro político, no Congresso Nacional e na sociedade civil, todas empenhadas na luta comum pela redemocratização do país.

No debate que o artigo provocou, concordei com os caminhos levantados por Frei Betto para enxergarmos uma luz no final do túnel, mas em resposta a ele levantei outras questões:

"Só uma pergunta: quem vai liderar este processo? Por onde recomeçar, se não temos mais líderes nem liderados, e os partidos faliram? Quem tem as respostas, os caminhos?"

Outro amigo, o jovem Thomas Ferreira Jensen, ativista dos movimentos sociais e colega dos nossos Grupos de Oração, me respondeu:

"A luz no fim do túnel será a soma dos milhares de vaga-lumes que piscam país afora. Em associações de bairro, grupos de jovens, cooperativas, inclusive em coletivos dentro de partidos políticos de esquerda. É uma turma que já não busca um líder, mas que vive formas autogestionárias de organização e assim constrói formas novas de trabalho de base, de formação, de resistência, algo na linha do Podemos da Espanha".

Tinha ouvido pela primeira vez a expressão "depressão cívica", empregada pela escritora Adélia Bezerra de Menezes,  no domingo, ao resumir o que estava sentindo, durante um jantar do nosso grupo no qual só se falou de crise.

É a mesma coisa que senti ao ler o dramático depoimento que me foi enviado no final da tarde de ontem pelo pequeno empresário Robson Oliveira, um antigo participante do Balaio, que desistiu de escrever comentários para o blog diante do clima de beligerância criado na disputa eleitoral. Escreveu ele:

"Boa noite Ricardo, desculpe te incomodar novamente, mas tenho visto como a situação está ficando a cada dia mais preocupante. Visto e sentido isso.

Recentemente, minha filha mais velha perdeu o emprego e eu, depois de 15 anos, finalmente tive que fechar minha pequena fábrica.

A situação está terrível, meu amigo, só não aparece por causa dos acordos sindicais que ainda seguram mesmo as taxas de emprego. O que importa agora, Ricardo, não é essa guerra estúpida nas redes. O que importa é: o que faremos?
Quem tem algum plano que ao menos sinalize alguma melhora ou um retrato mais confortante dessa piora? Ninguém assume os erros, ninguém se prontifica a reconhecer que cometeu falhas, ninguém quer saber de, antes de apontar os paralelepípedos nos olhos alheios, verifique os pneus velhos nos seus.

Quando a situação era, de certa forma, confortável, o que vimos foi uma prepotência sem tamanho que agora se volta contra seus próprios criadores.

A continuar dessa forma, sem qualquer plano, sem qualquer esperança de sair do atoleiro que se aproxima, vai começar a "faltar pão nessa casa"... e o ditado, mais uma vez, se fará verdadeiro".

Como ninguém é dono da verdade nem da última palavra, o único caminho que vejo é exatamente esse aberto pela fantástica oportunidade que a internet nos dá: procurarmos juntos as formas de sairmos dessa depressão cívica e realimentarmos nossas vidas de fé e de esperança. Uma hora, as crises sempre acabam passando. Já atravessamos muitas outras e sobrevivemos.

Por isso, peço à turma boa do Balaio que participe dessa busca, mas não envie mensagens para meu e-mail pessoal. É importante que todos saibam o que os outros estão pensando, utilizando a área de comentários. Com a palavra, vocês.

Vida que segue."

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