Luciano Martins Costa, Observatório da Imprensa
"Os jornais de terça-feira (16/9) consagram o princípio do novo
jornalismo brasileiro: é a crônica dos acontecimentos irrelevantes. Isso
quer dizer, rigorosamente, que as notícias selecionadas pelos editores
das principais casas de comunicação do país não guardam uma relação
direta com o valor que deveriam ter para o público.
Não se pode formular uma ideia do contexto político a partir de
declarações colhidas entre as protagonistas do poder político, da mesma
forma que não é possível formular uma opinião sobre a circunstância
econômica com base nos fatores expostos isoladamente no noticiário sobre
economia e negócios.
Fica-se sabendo, por exemplo, pelo Globo, que a apresentadora Patrícia Poeta deixa o Jornal Nacional,
substituída pela colega Renata Vasconcellos, e somos apresentados ao
resumo da carreira de uma e outra, como se o mensageiro fosse a
mensagem. Também somos informados de que a ex-ministra Marina Silva,
candidata do PSB à Presidência da República, critica o modelo de
exploração do pré-sal e se queixa de ser criticada por fazer críticas.
No mesmo episódio, a presidente da República que tenta a reeleição
afirma que Marina Silva se faz de vítima mas não pode ignorar que em
todos os partidos há sujeira embaixo do tapete – e cria o personagem
Pessimildo. Também o ex-governador Aécio Neves, que é considerado carta
fora do jogo por seus próprios correligionários do PSDB, tem seu
protagonismo garantido, ao afirmar que Marina e Dilma são a mesma coisa.
O “noticiário” se completa com descrições detalhadas de agendas e temas
distribuídos pelas assessorias de campanha, bem como um apanhado de
“opiniões” de candidatos sobre temas polêmicos. Também está disponível
uma lista de frases do dia planejadas por redatores e verbalizadas em
eventos, tudo devidamente organizado para ocupar tempo e espaço na
mídia.
No Estado de S. Paulo a mudança na bancada do Jornal Nacional também é notícia, assim como na Folha de S. Paulo: os dois diários paulistas publicam a mesma foto, uma selfie
do apresentador William Bonner com as duas colegas que se revezam no
telejornal. E o leitor fica suspeitando de histórias mal contadas, mas
os jornais tratam o assunto como um affaire de celebridades.
Coletânea de nulidades
Vai ver, é apenas isso mesmo: tanto no caso dos apresentadores que
fazem diariamente a interpretação daquilo que a Rede Globo considera
relevante dizer aos telespectadores, como as declarações que os
marqueteiros produzem para seus candidatos, tudo parece mesmo fazer
parte de um esforço para entreter a clientela. Que outra razão haveria
para destacar frases que não significam nada fora do contexto da
propaganda eleitoral, a não ser a rendição do jornalismo ao
entretenimento puro e simples?
O leitor e a leitora atentos apanham tudo que lhes é apresentado como o
que há de mais significativo nos acontecimentos e manifestações
escolhidos pelos editores para rechear as edições do dia, e temos uma
coletânea de nulidades.
Que proveito haverá de tirar o cidadão que se
depara, por exemplo, com notícias sobre artistas que declaram apoio a
esta ou àquela candidatura, se todos sabem que eles estavam ali para
sair na foto, e tentar uma chance de, mais adiante, ser contemplados com
o patrocínio oficial?
A rigor, não há diferença substancial entre esse noticiário na editoria
de Política e as descrições da rotina de celebridades, uma vez que tudo
se resume a performances planejadas justamente para chamar a atenção da
imprensa. Um exemplo: num dia, o candidato Aécio Neves se apresenta
numa central de favelas, e arrisca uns passos de dança; no dia seguinte,
é a vez da presidente que tenta a reeleição fazer o mesmo programa,
dizer as mesmas platitudes e ensaiar os mesmos passos patéticos.
Nenhuma dessas notícias, nenhum desses registros, contribui minimamente
para orientar o eleitor na importante escolha que deverá fazer daqui a
vinte dias. Nenhuma dessas declarações, nenhuma dessas pantomimas ajuda a
clarear o cenário político e esclarecer intenções, projetos de poder ou
programas de governo sobre questões fundamentais que angustiam a
sociedade.
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