"Sob
o ponto de vista de um jornalismo comprometido com a busca objetiva dos
fatos mais relevantes, essa seria a manchete: “ONU confirma sucesso na
redução da fome”. Mas o que faz a mídia tradicional do Brasil? Esconde a notícia
Luciano Martins Costa, Observatório da Imprensa
Brasil, Venezuela, Chile, Cuba e México são os países da América Latina que venceram a fome estrutural. Essa informação consta de um relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), que registra os avanços na luta global contra a insegurança alimentar. Cerca de 805 milhões de pessoas ainda têm que lutar por comida no dia a dia em todo o mundo, e a maioria delas se concentra em regiões afetadas por conflitos ou por condições climáticas adversas. O relatório completo, com 57 páginas em inglês, pode ser obtido no site da entidade (ver aqui).
Luciano Martins Costa, Observatório da Imprensa
Brasil, Venezuela, Chile, Cuba e México são os países da América Latina que venceram a fome estrutural. Essa informação consta de um relatório da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), que registra os avanços na luta global contra a insegurança alimentar. Cerca de 805 milhões de pessoas ainda têm que lutar por comida no dia a dia em todo o mundo, e a maioria delas se concentra em regiões afetadas por conflitos ou por condições climáticas adversas. O relatório completo, com 57 páginas em inglês, pode ser obtido no site da entidade (ver aqui).
Os principais jornais brasileiros usam como fonte o
resumo distribuído pela FAO, onde se pode ler, por exemplo, que o Brasil
foi um dos primeiros países do mundo a atingir o principal objetivo de
desenvolvimento do Milênio e as metas da Cúpula da Alimentação. O
documento será um dos destaques da 69ª Assembleia Geral das Nações
Unidas, que se realizará no dia 23 deste mês.
Um dos requisitos para o sucesso do programa, segundo o
relatório, é a manutenção de políticas de combate direto à fome
crônica, sustentadas por medidas colaterais destinadas a criar uma
estrutura de atendimento a outras necessidades das parcelas mais
carentes da população. No Brasil, o núcleo de ataque ao problema
alimentar foi o programa Fome Zero, seguido pelo complexo de medidas
agregadas no conjunto das bolsas de apoio ao desenvolvimento humano, a
partir de um sistema que assegura disponibilidade, acesso, estabilidade e
utilização de meios para manter uma nutrição segura.
Apesar das turbulências políticas que se sucederam em
várias partes do mundo e dos efeitos perversos da especulação financeira
no processo da globalização – que produziu uma grande crise econômica
mundial –, a última década registrou um avanço histórico na luta contra o
mais grave flagelo da humanidade – a falta de alimentos suficientes
para sustentar a vida.
O principal suporte dos números da FAO vem do
desempenho dos países asiáticos e latino-americanos citados no
documento, entre os quais se destaca o Brasil.
Notícia envergonhada
Sob o ponto de vista de um jornalismo comprometido com
a busca objetiva dos fatos mais relevantes, essa seria a manchete: “ONU
confirma sucesso na redução da fome”. Numa abordagem jornalística, essa
frase representaria a síntese a ser tirada do relatório intitulado “O
estado da insegurança alimentar no mundo – 2014”, porque os índices
declinantes da desnutrição crônica mostram que a fase mais difícil foi
ultrapassada, com a superação de barreiras estruturais para a oferta
segura de alimentos em grande parte do planeta e a passagem para a etapa
seguinte da melhoria da qualidade de vida – a da construção da
cidadania.
Mas o que faz a mídia tradicional do Brasil?
O Jornal Nacional, da TV Globo, destinou exatos
37 segundos à notícia – tempo que se dedica diariamente ao boletim
meteorológico –, destacando que, “vinte anos atrás, 14,8% dos
brasileiros viviam na miséria; agora, esse índice é de menos de 2%”. Uma
reportagem sobre a causa da morte do ex-jogador de futebol Hideraldo
Luiz Bellini – ocorrida em março –, a encefalopatia traumática crônica,
doença degenerativa ligada a esportes de contato, mereceu um minuto a
mais.
O Estado de S.Paulo foi o jornal que deu maior
importância ao documento, com um título em alto de página, na editoria
“Metrópole”, no qual se lê: “Brasil sai do mapa da fome, afirma ONU”.
A Folha de S. Paulo subverte a informação mais
importante, num texto de duas colunas de 9 centímetros de altura em que
tenta desqualificar o teor do relatório, com o título: “3,4 milhões
passam fome no Brasil, diz ONU”. Logo abaixo, afirma que “Órgão dirigido
por ex-ministro de Lula adota novo cálculo e elogia combate à
desnutrição”.
O Globo dá uma no cravo, outra na ferradura.
“ONU: 800 milhões de pessoas passam fome no mundo”, diz o título da
reportagem, seguido por uma linha fina onde se lê: “Relatório cita
Brasil como destaque positivo; desde 1990, famintos do país caíram de
14,8% para 1,7% da população”. O jornal carioca também faz referência ao
assunto no material sobre a disputa eleitoral, com texto em que a
presidente Dilma Rousseff comemora o anúncio da FAO.
Só para lembrar: a imprensa hegemônica do Brasil
sempre se opôs aos programas de redução da miséria, que tiveram, entre
seus inspiradores, a ex-primeira-dama Ruth Cardoso e o senador Eduardo
Suplicy. Agora que os resultados se consolidam, a notícia fica
escondida.
Como diria aquele apresentador da televisão: “É uma vergonha!”
Comentários