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Fazenda do aeroporto de Cláudio (MG) foi flagrada com trabalho escravo
"Inspeção,
realizada em outubro de 2009, encontrou 80 cortadores de cana de uma
destilaria da região trabalhando em regime análogo ao da escravidão.
A construção de um aeroporto em Cláudio (MG) não é o único estorvo
envolvendo a propriedade rural da família do senador Aécio Neves,
candidato à Presidência. Em outubro de 2009, uma inspeção de auditores
fiscais do Ministério do Trabalho e Emprego, com a presença do
Ministério Público do Trabalho e da Polícia Federal, encontrou 80
cortadores de cana de uma destilaria da região trabalhando em regime
análogo ao da escravidão. Destes, 39 cortavam cana na fazenda Santa
Izabel, localizada ao lado da área desapropriada para o aeroporto.
Por
conta dessa fiscalização, que também encontrou trabalhadores em outra
fazenda, a Santo Antônio, a Destilaria Alpha Ltda, foi responsabilizada
pela situação e inserida no cadastro de empregadores flagrados com mão
de obra análoga à de escravo em junho do ano passado – a chamada “lista
suja''. A relação, mantida pelo Ministério do Trabalho e Emprego e pela
Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, é utilizada
por bancos públicos e privados e empresas nacionais e estrangeiras para
evitar negócios. Membros da família Tolentino, a mesma da avó materna de
Aécio, respondem pela Destilaria Alpha.
A reportagem tentou
contato com advogado da Destilaria Alpha, mas ainda não obteve sucesso.
Assim que conseguir uma posição da empresa, publicará neste espaço.
Aécio Neves evidentemente não pode ser responsabilizado pela forma com a qual seus parentes tratam os trabalhadores.
Mas
o caso é uma amostra de algo que muitos ainda fingem não enxergar: como
grupos próximos do centro do poder político são capazes de subverter a
lei para garantir a perpetuação da exploração dos trabalhadores. E como
damos pouca importância a isso.
É interessante que algo tão
deplorável quanto trabalho escravo contemporâneo esteja tão perto de
famílias que detém o poder econômico e político. Mais ainda: como essas
famílias criam formas sofisticadas para burlar a legislação trabalhista
de forma a contornar direitos e baratear o custo da produção. Legislação
que, esses mesmos grupos de poder no poder, deveriam ter a obrigação de
zelar.
Estou tomando a fazenda Santa Izabel como exemplo, mas
isso se repete em território nacional, com grupos políticos que apoiam
os principais candidatos à eleição presidencial.
Os trabalhadores
foram atraídos por falsas promessas de boa remuneração, alojamento e
alimentação. Porém, ao chegarem ao município se deparavam com condições
diferentes do prometido. Se a vontade apertasse no meio do expediente,
teriam que fazer suas necessidades atrás de algum monte de cana. Não
havia alojamentos ou equipamentos de proteção adequados ou mesmo água
potável. Descontos irregulares aconteciam na remuneração. E quem
quisesse ir embora deveria conseguir dinheiro por conta própria para
voltar pois, apesar de terem sido trazidos, a Destilaria teria afirmado
que só retornaria os trabalhadores ao final da safra. Isso sem contar
que já havia sido firmado um termo de ajustamento de conduta com o
Ministério Público do Trabalho, em 2007, proibindo diversas dessas
situações.
Ou seja, não muito diferente de casos similares
flagrados pelo Ministério do Trabalho e Emprego nos últimos 19 anos,
quando o governo Fernando Henrique criou o sistema de combate a esse
crime e teve a coragem de reconhecer diante das Nações Unidas a
persistência de formas contemporâneas de escravidão por aqui.
Mais do que as condições em que estavam os trabalhadores, gostaria de me ater, contudo, à forma de contratação.
O
relatório de fiscalização resultante do resgate dos trabalhadores em
Cláudio (MG) detalha, com provas documentais e entrevistas, como se dava
o processo para burlar a lei e tirar da Destilaria Alpha a
responsabilidade trabalhistas pelos cortadores de cana.
A
“cantina'', local utilizado para preparo das refeições dos
trabalhadores, era mantida por José do Carmo Pereira dos Santos e seus
familiares. Ele era o responsável por aliciar os trabalhadores em suas
cidades de origem (Brasília de Minas e Luislândia, ambas em Minas
Gerais) e trazê-los para prestar serviços diretamente à Destilaria Alpha
Ltda, através da empresa Vanilda da Silva Santos-ME.
Através de
inspeções nas frentes de trabalho das fazendas Santa Izabel e Santo
Antônio, verificou-se que os trabalhadores atuavam no corte de
cana-de-açúcar. Parte deles acreditava que o patrão era a usina. Porém, a
maioria não sabia explicar porque suas carteiras de trabalho não eram
anotadas pela Destilaria Alpha e sim por Vanilda da Silva Santos-ME, que
nem sequer conheciam. Outros trabalhadores estavam empregados por uma
outra empesa, a Ômega Agrícola Ltda.
A Destilaria Alpha foi
representada à equipe de fiscalização por Quinto Guimaráes Tolentino
Filho, Onias Guimaráes Tolentino e Mariana de Campos Tolentino. De
acordo com a fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego, a Alpha é
quem controlava o trabalho dos cortadores de cana.
Segundo o
relatório, apesar de todos os pressupostos de relação de emprego se
darem com a Destilaria Alpha Ltda e do cultivo de cana-de-açúcar ser uma
de suas atividades-fim, a mesma valeu-se de um aliciador de mão de
obra, de nome José do Carmo Pereira dos Santos e alcunha “Gambá'' para
arregimentar esses trabalhadores em seu município de origem já pelo
terceiro ano consecutivo, conforme afirma o relatório com base em
depoimentos e análise documental.
Este, além de ter um acordo
financeiro com a usina para aliciar e controlar o trabalho desenvolvido
por esses trabalhadores, ampliava, com a anuência da Destilaria Alpha
Ltda, seu esquema de exploração e lesão aos direitos desses cortadores,
sendo o fornecedores de todas as suas refeições.
Ainda buscando
redução de custos trabalhistas e fiscais, conforme depoimentos prestados
pelos próprios prepostos legais da usina aos fiscais, a Destilaria
Alpha Ltda valeu-se da empresa Vanilda da Silva Santos – ME como
empregadora formal dos trabalhadores aliciados por José do Carmo Pereira
dos Santos. Vanilda – ME não teria idoneidade econômica, sendo
utilizada com o único fim de intermediar a mão de obra em favor da
Destilaria Alpha Ltda.
De acordo com os auditores fiscais,
Vanilda da Silva Santos, proprietária da empresa, era esposa de Antonio
Newton dos Santos, contador da empresa Destilaria Alpha Ltda e detentor
de procuração pública com amplos poderes de representação da empresa
registrada em nome de sua esposa.
O relatório afirma que Onias
Guimarães Tolentino possuía poderes de representação informal tanto da
Destilaria Alpha Ltda quanto da empresa Ômega Agrícola Ltda, e junto com
o Eduardo Henrique da Silva, gerente industrial da usina, teria
estabelecido e concebido com José do Carmo Pereira dos Santos todo o
sistema de arregimentação e controle da mão de obra, sendo além disso,
um dos idealizadores da relação triangular com a empresa Vanilda da
Silva Santos – ME. A estrutura teria sido gestada também com o contador
da usina, Antônio.
Este caso mostra como grupos próximos do poder
político são capazes de sentir-se seguros o suficiente para subverter a
lei a fim de garantir a exploração dos trabalhadores. Flagrados, alguns
usam o “mas sempre foi assim'', que justifica a maiores aberrações pela
manutenção da exploração como “tradição''. Outros culpam o Estado, que
se interpõe sobre a relação de compra e venda de força de trabalho. Para
eles, a legislação impede a livre negociação. Como se a relação
capital-trabalho fosse baseada sempre em igualdade de condições.
Como disse, esta história não tem vinculação com este ou aquele grupo. E ninguém escolhe a família que tem.
Porque
a superexploração do trabalho não vê fronteiras ideológicas ou
partidárias. O mesmo vale para os de Dilma Rousseff. Por exemplo,
Armando Monteiro Neto é irmão e ex-sócio de Eduardo Queiroz Monteiro,
proprietário da então Destilaria Gameleira (hoje Araguaia), no qual
foram libertados 1003 pessoas em condições análogas às de escravo em
2005 – uma das várias operações de resgate ocorridas naquela fazenda de
cana. Armando é candidato ao governo do Estado de Pernambuco, na frente
nas pesquisas e é da base de Dilma.
Infelizmente a pauta dos
direitos do trabalhador passa ao largo do período eleitoral. Quando
aparece, diz respeito à geração de empregos, sem que se discuta a
qualidade do emprego que estamos gerando. Isso é ótimo para quem não se
importa com a qualidade de vida da população e sim com os lucros
oriundos da exploração desta."
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