Cientistas políticos minimizam importância de programas de governo

Dilma, Aécio e Campos ainda não apresentaram os seus programas de governo, apenas diretrizes básicas (Foto: Terra)

Sérgio Rodas Oliveira, Terra Magazine


"Faltando 60 dias para o primeiro turno das eleições, nenhum dos três principais candidatos à presidência da República – Dilma Rousseff (PT), Aécio Neves (PSDB) e Eduardo Campos (PSB) – apresentou o seu programa de governo ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Todos eles protocoloram junto à Corte apenas diretrizes que orientarão os planos.
No entanto, cientistas políticos ouvidos pelo Terra Magazine minimizam a importância da entrega desses documentos. De acordo com o professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Fábio Wanderley Reis, poucos eleitores escolhem candidatos com base nas ideias deles.
“A suposição envolvida nessa posição [de que não entregar o programa de governo prejudica o processo de escolha dos eleitores] é meio irrealista, utópica. Idealiza um eleitor, imaginando que ele decide de uma maneira racional, com base em informações que ele vai buscar e que ele sistematiza, que ele adota posições diferenciadas a respeito de diversos assuntos, e avalia até que pontos as posições dos candidatos são correspondentes às dele… isso praticamente não existe. Inclusive, muitos estudos mostram que, quando você tem identificação partidária, o que predomina é o irracionalismo total”, analisa Reis.
Para ele, só uma minoria mais informada presta atenção às ideias. Por isso, a “campanha eleitoral é mais focada em imagens do que conteúdo”. Mas o professor da UFMG faz a ressalva de que há sempre um aspecto substancial básico associado a essas imagens. Como exemplo, ele cita a ligação do ex-presidente Lula (PT) com políticas sociais, como o Bolsa Família. 
O pesquisador do Centro de Política e Economia do Setor Público (Cepesp) Sérgio Praça discorda da tese de Reis de que as imagens são mais importantes do que o conteúdo.
“Eu não acho que [essa] é uma eleição baseada em imagens. Pelo contrário: acredito que essa eleição tem potencial para ser a mais programática em muito tempo. Não que as últimas não tenham sido. Mas acho que quando você tira de cena um político tão carismático quanto é o Lula, essa dimensão [da prevalência de imagens em oposição às ideias] cai também”, opina Praça.
Mas ele aponta uma condição para que essa previsão se concretize: que os debates entre os presidenciáveis tenham foco em pontos específicos, e não fiquem presos em generalidades e ataques pessoais.
Sérgio Praça acredita que propostas concretas vêm sendo apresentadas pelos candidatos – especialmente por Aécio e Campos -, tanto nas diretrizes de governo protocoladas junto ao TSE quanto em entrevistas e sabatinas. O cientista político elogia o discurso do tucano, que, na opinião dele, é “coeso” e “propõe mudanças”. Mas ele ataca as ideias do ex-governador de Pernambuco, que seriam “de um populismo extremo e nocivo” e fruto de desespero com a estagnação nas pesquisas eleitorais.
Formato do horário eleitoral gratuito e papel dos marqueteiros
Segundo alguns especialistas, o formato do horário eleitoral gratuito não favorece a exposição e o debate de ideias, e sim as propagandas elaboradas e dramáticas. O ex-governador de São Paulo e candidato ao Senado José Serra (PSDB) declarou recentemente que o ideal seria mudar o formato das veiculações, colocando os candidatos em frente a apenas um microfone e uma câmera, para que eles expusessem suas ideias sem recursos audiovisuais.
Sérgio Praça vê dois lados nessa proposta do tucano. O positivo seria a maior ênfase no conteúdo. O negativo seria a diminuição no número de pessoas que assistiriam às veiculações.
Para Fábio Wanderley Reis, a medida de Serra favoreceria os candidatos com maior poder de comunicação.
“É claro que isso seria muito desvantajoso para uma Dilma, que é, evidentemente, uma comunicadora péssima, não emenda três frases sem se confundir, se enrolar. Mas seria excelente para um Lula, por exemplo”, afirma o cientista político. Na opinião dele, esse modelo de horário eleitoral aproximaria o Brasil da democracia de Atenas, na Grécia Antiga, onde “quem era bom de retórica, ganhava”.
Com a crescente sofisticação das propagandas eleitorais nos últimos anos, marqueteiros como Duda Mendonça, João Santana e Nizan Guanaes passaram a ser tratados como estrelas, disputados a tapas pelos partidos, e viram seus honorários crescerem substancialmente. Porém, será que eles são mais decisivos para uma vitória em eleição do que assessores técnicos (juristas, economistas, sociólogos, médicos etc.)? Infelizmente, sim, diz Reis.
“Eu acho ruim. Mesmo com todas as reservas do modelo idealizado, eu acho que é preferível que técnicos competentes em áreas variadas tenham maior influência do que o sujeito que sabe os truques. Penso ser lamentável que eleição seja uma questão de truque”, lamenta o professor emérito da UFMG.
Embora concorde que o horário eleitoral gratuito seja dominado pelo marketing, Praça discorda da opinião de que os profissionais da área mandam nas campanhas e garantem vitórias de candidaturas vazias em conteúdo.
“Além do marqueteiro, tem uma legião de gente muito bem equipada e muito competente. Então, se um marqueteiro chegar e disser ‘não pode colocar isso no programa de governo’, não será muito bem visto [pelo resto da equipe]”, argumenta o pesquisador do Cepesp.
Mas afinal, um presidente da República pode ser eleito majoritariamente por causa de suas ideias e propostas? Segundo Sérgio Praça, sim. Na visão dele, é muita ingenuidade “achar o contrário, que propostas e ideias não têm importância nenhuma para as eleições”. “O povo não é, nem de longe, tão ingênuo e mal informado quanto imaginam”, defende.
Já Reis é mais pessimista quanto a essa questão.
“Eu acho que raramente [um presidente da República pode ser eleito majoritariamente por causa de suas ideias e propostas]. Pode até acontecer, mas é preciso que elas [ideias e propostas] se acoplem de uma maneira afortunada com esse substrato mais difuso e complicado que a gente está falando, que é a divulgação de uma imagem”, opina."

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