Manipulação ou burrice? Como a Folha inverte o sentido de uma declaração

Fernando Brito, Tijolaço

“Estado é contra reivindicação de direitos”, diz Ministro.”

É uma das chamadas da editoria de política, hoje, da Folha.
O leitor – que em geral é  leitor de títulos, desde que as folhas ficavam penduradas com pregador de roupa nas bancas de jornal – entenderá que  o Governo é contra reivindicarem-se direitos, não é?

Só que a matéria diz exatamente o contrário: é uma queixa do Secretário-Geral da Presidência da república, Ministro Gilberto Carvalho, para quem o aparelho de estado no Brasil tem uma cultura de resistir e tratar como “problema” tudo aquilo que é reivindicação de direitos, individuais e, sobre tudo, coletivos.

E para, mais além disso, ter o Governo a obrigação de fazer cumprir a lei, mesmo quando a sabe injusta.

Nem falo do trabalho do repórter que fez a matéria: o texto está correto, embora burocrático, talvez porque ele não tenha tido espaço para aprofundar e esmiuçar o conteúdo da fala de Carvalho.

Mas o que a editoria faz, se não é manipulação, é, ao menos, incapacidade de entender o que se se disse.

Não é raro isso.

Uma vez, quando era assessor de imprensa de Brizola, fui procurado com um repórter – bem novo, meio foquinha, embora eu também ainda não tivesse nenhum fio de cabelo branco…-  com uma pauta pronta da redação.

Muito técnico, ele relatou que, enquanto em todo governo anterior tinham acontecido apenas X manifestações no Palácio Guanabara, nos primeiros – sei lá – 100 dias do Governo Brizola já haviam ocorrido o triplo…. E perguntou: o que o Governo acha disso?

- Acha ótimo, eu respondi, para ele arregalar os olhos, estupefato. Repeti: pode escrever: O governo do Rio de Janeiro acha ótimo.

Mas a que os senhores atribuem isso? – continuou, meio sem-jeito…
- A três fatores: primeiro, as pessoas precisam: elas vêm aqui pedir direitos, não favores: água, esgoto, luz, aumento de salário, lote para morar, terra para plantar, escola para as crianças; depois, porque pode vir, não tem mais bordoada em cima deles. E o terceiro é que as pessoas vêm porque acreditam que adianta, porque tem um governante que foi eleito com o voto deles, embora nem sempre a gente possa resolver.

O menino parecia que ia ficando em outro planeta, eu acho que ele não entendia o que eu dizia. Tudo o que ele esperava era uma “defesa técnica”, um amontoado de “fizemos isso, fizemos aquilo” burocrático e sem-vergonha, porque por mais que tivéssemos feito, certamente teríamos feito muito pouco, diante daquele mar de necessidades e injustiças.

Por isso, dou o benefício da dúvida ao editor da Folha.

Pode até não ter tido a intenção de manipular.

Pode ter sido pior: não teve a capacidade de entender.

Para estes, liberdade é o direito de preencher um formulário-padrão…"

Comentários