Luciano Martins Costa, Observatório da Imprensa
“A apresentação dos condenados na Ação Penal
470, ocorrida na sexta-feira (15/11), destampou a caixa de Pandora da imprensa
e produz uma catarse que avança até esta segunda-feira (18/11) nas páginas dos
jornais e nos campos de comentários de suas versões digitais.
Petistas e antipetistas chegam ao paroxismo nas redes
sociais, enquanto alguns colunistas e blogueiros que se notabilizaram nos
últimos anos pelo uso indiscriminado de adjetivos celebravam como se a decisão
do Supremo Tribunal Federal fosse uma vitória definitiva do bem contra o mal.
As reportagens dos jornais e a versão resumida das
revistas semanais de informação representam uma espécie de capítulo final de
uma novela da televisão, com as costumeiras lições de moral e a repetição do
olhar parcial que marcou a atuação da imprensa hegemônica durante todo o
processo. O resultado é apenas muita histeria.
Isolada em sua opção centrista, Carta Capital
tende a considerar a prisão dos condenados uma precipitação do STF, e levanta a
hipótese de uma candidatura do presidente do Supremo, ministro Joaquim Barbosa,
à presidência da República.
A revista Época, dada ultimamente a brados
retumbantes, sai-se com a afirmação de que a decisão judicial “inaugura uma
nova era na democracia brasileira – a Era dos Corruptos na Cadeia”.
IstoÉ dá uma no cravo e outra na
ferradura, acompanhando o vozerio geral mas lembrando que há muito mais a ser
apurado e punido para que se possa celebrar alguma mudança nos hábitos da
política – cita o caso da máfia dos fiscais na capital paulista e vasculha a
gaveta do procurador do estado Rodrigo De Grandis, que quase anulou o esforço
das autoridades da Suíça para condenar os acusados em desvios em obras do metrô
e do sistema de trens, e é apanhado protegendo agentes públicos, empresários e
lobistas envolvidos no escândalo.
A revista Veja, que há muito trocou o
jornalismo pela panfletagem, faz o que se espera dela: transformou a expedição
dos mandados de prisão de doze dos condenados em tema de comício para o que há
de mais conservador entre seus leitores, com sua peculiar interpretação da
história recente.
A Folha de S. Paulo, que nas últimas semanas faz
um esforço por dividir a clientela de Veja, tem abrigado alguns dos
textos mais destemperados que o público pode apreciar.
Espalhados pelos principais órgãos de comunicação do
país, alguns desses autores celebram os fatos como uma vitória pessoal, num despudor
de jornalismo marrom.
O zoológico de Brasília
A imprensa brasileira, que nos dias anteriores parecia
à beira de um ataque de nervos, inicia a nova semana com um desafio a ser
observado: como qualificar o que virá depois da catarse.
Como num zoológico, os presos têm sua rotina
devassada, revelando-se que comem com talheres de plástico, dormem em colchões
vagabundos e não têm banho quente na prisão em Brasília.
Se, como afirma Época explicitamente, começou a
era da honestidade na democracia brasileira, é de se questionar quando o leitor
vai conhecer os detalhes daquela denúncia de cartel sem culpados e o caso do
esquema de desvios que minou a capacidade de investimento da prefeitura de São
Paulo durante quase dez anos.
Curiosamente, é na Folha, onde passaram a se
abrigar alguns dos mais alucinados representantes do pensamento reacionário,
que sai o artigo mais explícito em defesa dos líderes do PT enviados para a
prisão. “Num país onde Paulo Maluf e Brilhante Ustra estão soltos, enquanto
Dirceu e Genoíno dormem na cadeia, até um cego percebe que as coisas estão fora
de lugar”, diz o texto.
Interessante observar também que tanto esse
articulista, como aqueles que hoje aparecem em posições conservadoras,
militaram, durante a juventude, na mesma tendência trotskista, que no movimento
estudantil se chamava Liberdade e Luta.
A prisão dos antigos dirigentes do Partido dos
Trabalhadores não terá, necessariamente, grande influência nas eleições do ano
que vem, porque o desgaste maior ocorreu durante o longo processo, e de lá para
cá a aliança governista permanece no poder. O fim do processo deve reduzir o
nível de histeria geral na “gaiola das loucas” em que se transformou o
noticiário político.
Daqui para a frente, o leitor atento deve caprichar em
suas anotações, registrando diariamente o esforço que a imprensa hegemônica
certamente vai fazer para cobrar o rigor dos “novos tempos da Justiça” também
nos outros casos corrupção.’
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