Luciano Martins Costa, Observatório da Imprensa
“O Conselho Regional de Medicina do Ceará obteve liminar em ação na qual
requer o direito de negar registro provisório aos profissionais inscritos no
programa Mais Médicos. A representação dos médicos no Espírito Santo protocolou
processo no mesmo sentido, e tudo indica que a iniciativa vai se repetir em
outros estados, numa sucessão de manobras com a intenção declarada de atrasar e
desmoralizar o projeto governamental.
O Ministério da Saúde sentiu o golpe e seus porta-vozes demoraram a
acreditar que as entidades corporativistas da medicina brasileira chegariam a
esse ponto.
Não deveria haver surpresas. As entidades que representam os médicos
brasileiros se revelam desde o anúncio desse programa como uma versão em branco
dos “Black blocs”, que se apropriaram das manifestações de rua após o refluxo
dos protestos de junho. Como os vândalos encapuzados, eles representam agora
uma confraria que pode ser chamada de “White blocs”: priorizam a ação sobre a
reflexão, se destacam pela tática da agressão, mas a partir de suas iniciativas
não se pode identificar qual é sua estratégia. Provavelmente porque não possuem
uma estratégia eticamente defensável.
O chamado “bem comum”, genericamente invocado para justificar
bandalheiras e iniciativas contra o interesse coletivo, está presente tanto nos
manifestos das entidades médicas como nas palavras de ordem tartamudeadas pelos
aloprados que saem às ruas em busca de adrenalina.
A mídia tradicional condena liminarmente os “Black blocs”, mas oferece
amplo espaço para as entidades da medicina privada que pretendem pontificar
sobre saúde pública.
Os dois fenômenos são muito parecidos na tática e no que pode vir a
resultar de suas ações.
A imprensa critica os predadores mascarados porque atacam bancos e
representações do poder público, mas não se vê nos jornais nem na televisão a
imagem dos jovens “Black blocs” que, na manifestação do dia 7 de setembro, na
Avenida Paulista, erguiam cartazes com o retrato do general Emilio Garrastazu
Médici e pediam a volta da ditadura.
A imprensa poupa os “White blocs” porque são mais uma oportunidade de
proselitismo político.
Estratégia dissimulada
A grande diferença entre esses “blocs” aparentemente tão díspares quanto
o branco e o preto é que os “Black blocs” não têm um objetivo além da negação. Sua
mensagem é a ação, e violência é o máximo que podem produzir em termos de
proposta política – mas embora possam parecer um sistema estruturado, não o
são. Seriam mais apropriadamente descritos como um programa de destruição que
se estrutura aleatoriamente pela ação.
Já os “White blocs” são um sistema estruturado e desestruturante.
Organizam-se
em torno de uma agenda específica e pretendem desfazer aquilo que parece
ameaçador a seus interesses como conjunto corporativista.
Nenhum dos dois grupos pode revelar sua estratégia. Os “black” porque
não a possuem, os “white” porque não podem revelar que se colocam liminarmente
contra ações emergenciais destinadas a amenizar os carências da saúde pública.
O interessante é que, no conjunto, as iniciativas dos dois agrupamentos
parecem produzir um efeito contrário: os grupos de predadores são repudiados
pelos movimentos sociais; a tática das entidades médicas parece aumentar a
aprovação da sociedade ao programa de envio de profissionais de saúde para os
lugares desassistidos.
Os jornais de quarta-feira (11/9) reproduzem resultado de pesquisa
realizada por iniciativa da Confederação Nacional do Transporte.
>> O Estado de S. Paulo afirma: “Pactos ajudaram Dilma, diz
pesquisa”.
>> A Folha de S. Paulo anuncia: “Aprovação do governo Dilma
sobe 7 pontos desde julho, diz pesquisa”.
>> O Globo é mais direto: “Mais Médicos ajuda popularidade
do governo Dilma”.
Os três diários se veem obrigados a
registrar que, embora aos trancos e barrancos, a resposta do governo atende
parte das reivindicações.
É bastante provável que o governo federal
só tenha se movimentado, dando partida ao programa Mais Médicos e outros
projetos que vinham se arrastando na lenta burocracia de Brasília, por causa do
impacto das manifestações de junho. Pode-se afirmar, por outro lado, que o
governo bate cabeça e demonstra pouca agilidade e firmeza em muitas questões
que foram levadas às ruas, como a reforma política. Mas a violência dos “Black
blocs” e as chicanas dos “White blocs” não são alternativas aceitáveis.”
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