“Em editorial, jornal O Globo, de João
Roberto Marinho, afirma que o povo não compreenderá a decisão do STF, caso
Celso de Mello confirme sua posição pró-embargos, ou seja, em defesa do direito
de defesa; o que a sociedade jamais comprendeu, no entanto, foi por que o Globo
apoio um regime que matou, torturou e suprimiu garantias individuais, como o
habeas corpus
Em
editorial publicado nesta sexta-feira, o jornal O Globo, de João Roberto
Marinho, faz um apelo a Celso de Mello. Pede que ele reflita mais um pouquinho
e mude sua posição em relação aos embargos infringentes. Caso não o faça, diz o
Globo, a população não compreenderá a Justiça brasileira.
No
entanto, que a sociedade não entende – e não aceita – são os motivos que
levaram as Organizações Globo a apoiar o golpe militar de 1964, que implantou
uma ditadura sanguinária, que matou, torturou e suprimiu garantias individuais,
como o habeas corpus. Naquele tempo, nem se podia falar em justiça. Abaixo, o
editorial do Globo:
Possibilidade de condenados no processo do mensalão, onde tem havido
amplo direito de defesa, serem rejulgados torna Judiciário mais incompreensível
para o povo
Em
mais uma sessão histórica no processo do mensalão, o empate, ontem, em cinco
votos, em torno da legalidade dos embargos infringentes colocou nas mãos do
decano do Pleno do Supremo, Celso de Mello, aceitar ou permitir a prorrogação
do julgamento. Se acolher a tese da defesa, tornará os caminhos da Justiça
brasileira ainda mais incompreensíveis para a população. Afinal, apesar de seis
anos de tramitação do processo no Supremo, mais de 50 sessões, após garantido
amplo direito de defesa, poderá ser concedida a benesse de um novo julgamento a
11 dos réus, em condenações nas quais obtiveram pelo menos quatro votos em seu
favor.
É
verdade que os 11 mensaleiros beneficiados pela aceitação dos embargos
infringentes estão condenados por algum crime, inclusive com a pena de prisão
em regime fechado, caso de Marcos Valério, por exemplo, operador do esquema, a
ser trancafiado devido à comprovada evasão de divisas. Mesmo os mensaleiros
estrelados, os petistas José Dirceu, Delúbio Soares, José Genoíno e João Paulo
Cunha carregarão para sempre na folha corrida o registro de condenação por
corrupção. Não é pouca coisa.
Mas
o rejulgamento, com chance de revisão de condenações e a suspensão de penas a
serem cumpridas em regime fechado, reforçará o ceticismo com a Justiça,
considerada leniente com ricos e poderosos. Os que acham que cadeia foi feita
para pobre terão mais um forte argumento.
Primeiro
dos votos, e a favor dos embargos, Luís Roberto Barroso, recém-empossado,
reconheceu haver argumentos fortes nos dois lados da questão: se a lei federal
8.038, de 1990, ao não citar este tipo de embargo, o havia suprimido do
regimento do tribunal ou não. Optou por garantir o recurso e foi seguido por
quatro outros ministros, também divergentes da posição do relator do processo,
Joaquim Barbosa, presidente da Corte, contrário à aceitação dos embargos.
O voto da ministra Cármen Lúcia, em apoio
ao relator, trouxe argumento forte, como previra Barroso. Depois de ressaltar a
primazia constitucional do Congresso na regulação dos ritos judiciários —
porque a Justiça é nacional —, a ministra considerou inexistente a
possibilidade dos embargos, por força da lei federal. E ainda alertou para a
possibilidade de condenados pelo Superior Tribunal de Justiça, fórum
privilegiado também para autoridades, não terem o respaldo desses embargos, ao contrário
dos processados pelo Supremo. Estará configurado um tratamento desigual pela
Justiça, um evidente atropelo da Constituição. Luiz Fux, Gilmar Mendes, Marco
Aurélio Mello, ministros que também apoiaram o voto do relator, não deixaram de
chamar a atenção para a incoerência de se permitir apenas no Supremo este tipo
de recurso. “O sistema não fecha”, disse Marco Aurélio.
O adiamento do desfecho ao menos dá um
tempo ainda maior a Celso de Mello para continuar em suas reflexões. Considerando,
como alertou Gilmar Mendes, os reflexos de sua decisão em toda a magistratura e
nas próprias instituições.”
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