Então governador,
José Serra inspeciona trem da Alstom em 2009 / Moacyr Lopes Júnior/Arquivo
Folhapress
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Surgiu o primeiro sinal de que a série de
fraudes que contaminou as concorrências do metrô paulista são parte da crise
vivida todos os dias por milhões de usuários. Levantamento realizado por
funcionários da Linha 3-Vermelha com base no registro oficial de falhas do
sistema mostra que trens recentemente adquiridos ou reformados pelo governo
estadual de São Paulo junto a empresas acusadas de formação de cartel
apresentam problemas técnicos em frequência até quatro vezes maior que as
composições antigas, com cerca de 30 anos de uso. Algumas chegam a registrar
média de 35 defeitos por dia.
Os dados são preliminares. Foram levantados
de maneira informal por trabalhadores impressionados com as constantes quebras
e acidentes envolvendo as novas aquisições da empresa. Diante das denúncias, é
essencial que a Companhia do Metropolitano (Metrô), ligada ao governo do
estado, apresente as estatísticas oficiais sobre falhas. Só ela possui os
registros completos de panes. Até o momento, porém, seus diretores têm se
negado a colocá-los à disposição.
Os números que seguem são resultado da
análise do histórico de oito dos cerca de 50 trens que operam no trecho
leste-oeste da malha metroviária paulista, e foram obtidos após consulta a um
sistema conhecido como S-GUT, que registra informações sobre todas as
composições do metrô, tais como localização, quilômetros rodados, tempo de
operação e número de problemas técnicos denunciados pelos condutores. O S-GUT
pode ser acessado a partir de computadores conectados à rede da empresa, mas
apenas permite visualização dos dados na tela. As informações não podem ser
gravadas. Por isso, a contagem de falhas teve de ser realizada manualmente.
Comparações
Funcionários do metrô analisaram os últimos
1.000 dias de operação de trens novos, reformados e antigos que circulam pela
Linha 3-Vermelha. Entre os novos, foram averiguados os registros das
composições conhecidas como H59 e H60, construídos pela espanhola CAF e
entregues à companhia entre 2008 e 2010. Entre os reformados, foram escolhidos
os trens K01 e K07, modernizados pelo consórcio MTTrens, composto pelas
empresas MPE, Temoinsa e TTrans, em circulação desde 2011. E também os L26 e
L27, recondicionados pela francesa Alstom em conjunto com a Iesa a partir do
mesmo ano. Novos e reformados foram comparados aos antigos conhecidos como 302
e 335, fabricados pela Cobrasma e Mafersa nos anos 1980.
Alstom, TTrans e CAF estão diretamente
envolvidas nas denúncias de formação de cartel para burlar a concorrência em
editais do governo do estado de São Paulo para reforma de composições e
ampliação da malha metroferroviária na região metropolitana da capital. De
acordo com uma das empresas que integrou o esquema, a alemã Siemens, membros do
alto escalão do governo paulista nas gestões Mário Covas (1995-2001), Geraldo
Alckmin (2001-2006) e José Serra (2007-2010), todos do PSDB, teriam participado
e acobertado a questão. Cálculos preliminares do Conselho Administrativo de
Defesa Econômica (Cade) apontam que o conluio teria provocado prejuízos de R$
425 milhões ao erário estadual.
De acordo com o levantamento dos
funcionários do metrô, as composições das frotas K e L, reformadas pela MTTrens
e Alstom, respectivamente, foram as que mais apresentaram falhas. Os defeitos
podem variar de problemas no ar condicionado a problemas mais graves de
segurança, como trepidações excessivas, deficiência nos freios, mau fechamento
das portas e panes nos sensores de descarrilamento. Aliás, pertence à frota K o
trem que saiu dos trilhos no último dia 5 de agosto nas proximidades da estação
Palmeiras-Barra Funda, destruindo 150 metros do sistema de eletrificação e
provocando “curto-circuitos, estouros e fumaça”. Por sorte, dizem metroviários,
ninguém saiu ferido.
Números
A pesquisa dos funcionários do metrô mostra
que, em seus últimos 1.000 dias de operação, os trens da frota K, reformados
pela MTTrens, registraram 27,6 falhas por dia, somando as falhas repetidas – ou
seja, as que são registradas mais de uma vez ao dia pelos condutores. Sem
contar as repetições, o número cai para uma média de 3,75 defeitos diários. Nos
trens da frota L, recondicionados pela Alstom-Iesa, os metroviários encontraram
uma média de 35,75 problemas por dia, incluindo as repetidas. O registro de
falhas únicas diárias chegou a um número diário de 2,6.
As composições novas da frota H, fabricadas
pela CAF, conseguiram um desempenho melhor, mas ainda assim alta para uma frota
recém-inaugurada: são 8,95 falhas por dia, contando as repetidas, e 0,8 falhas
diárias únicas. Mas o melhor desempenho foi observado nos trens antigos. Apesar
de estarem há cerca de 30 anos em circulação, as composições da
Cobrasma/Mafersa registraram 1,75 defeitos repetidos por dia, bem menos que os
novos trens da CAF, e 0,9 falhas únicas, praticamente a mesma média de uma
frota que está em operação há menos de cinco anos.
Na comparação, a análise dos metroviários
mostra que, em seus últimos 1.000 dias de atividade, os trens K01 e K07,
reformados pela MTTrens, apresentaram média de falhas diárias 4,17 maior do que
as composições antigas. E os trens L26 e L27, recondicionados pela Alstom-Iesa,
registraram média diária de defeitos 2,8 vezes mais alta que as máquinas que
operam há mais de 30 anos. A grande quantidade de problemas tem feito com que a
média dos quilômetros rodados das composições novas e reformadas, que ficou em
234 km/dia no período analisado, seja bem menor que a média geral do metrô: 550
km/dia.
O Metrô foi procurado, mas não respondeu às
perguntas da reportagem.”
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