Em crise de manutenção, Metrô de São Paulo põe trens com falhas para circular


Reformados, trens da frota K foram tirados e
colocados em operação seis vezes em cinco
dias / Rubens Chaves/Arquivo/Folhapress

Registros mostram que empresa releva problemas de segurança em composições da mesma frota cujo trem descarrilou no início de agosto, colocando em risco vida de trabalhadores e usuários

Tadeu Breda, RBA

A Companhia do Metropolitano de São Paulo (Metrô) ignorou falhas apontadas por funcionários e colocou em circulação, na noite da última sexta-feira (23), pelo menos um trem com defeito para atender os usuários da Linha 3-Vermelha, que liga a capital paulista de leste a oeste. A “solução” teria sido adotada para contornar um desfalque de sete composições no trecho, todas afastadas por problemas técnicos. Registros no diário de condutores e telas de monitoramento do sistema revelam ainda que, na semana passada, dois trens da chamada frota K foram retirados e colocados em circulação pelo menos seis vezes em cinco dias – também devido a falhas.

A frota K possui 25 composições, que estão sendo paulatinamente reformadas desde 2010 pelo consórcio MTTrens, formado pelas empresas MPE, Temoinsa e TTrens – esta última envolvida nas denúncias de cartel em conluio com governos tucanos em São Paulo. Pertence a essa frota a composição que descarrilou na manhã do dia 5 de agosto, nas proximidades da estação Palmeiras-Barra Funda, na Linha 3 Vermelha. Havia passageiros, mas, felizmente, ninguém se feriu. Segundo o Sindicato dos Metroviários, o acidente foi provocado pela ruptura de uma peça chamada “truque” ou “truck”, termo técnico que designa o sistema composto por rodas, tração, frenagem e rolamentos do trem.

Devido ao acidente do dia 5, que atingiu uma composição conhecida como K07, o Metrô recolheu todas as unidades da frota K para testes e manutenções. A empresa, porém, voltou a colocar em operação duas delas – os trens K10 e K14 – na segunda e terça-feira, dias 19 e 20 de agosto. Um dia depois, na quarta (21), ambas voltaram a ser encostadas. Na quinta (22), entraram novamente em circulação. Com a persistência das falhas, detectadas pelos condutores e denunciadas ao controle operacional, no mesmo dia os trens foram recolhidos para novos testes. Os defeitos foram confirmados, e as máquinas permaneceram no pátio.

Na sexta-feira (23), deparado com o afluxo de passageiros no horário de pico, o Metrô decidiu colocar novamente o K14 para atender os usuários – falhas constantes teriam deixado a frota da Linha 3-Vermelha com um desfalque de sete composições, e a eficiência do serviço estava comprometida. O K14, porém, não conseguiu operar dentro de limites aceitáveis de segurança e teve de ser encostado mais uma vez. Só que no meio da noite a empresa resolveu colocá-lo novamente para atender a população, mesmo com irregularidades. Ainda ontem (26), o K14 continuava apresentando defeitos. “Ruídos anormais” motivaram novo check up: um dos discos de freio estava solto.

Registros elaborados pelos condutores – e que são repassados periodicamente às equipes de manutenção – mostram que o K14 sofreu ao menos 16 falhas entre os dias 20 e 23 de agosto. No sábado (24) há registro de um defeito “grave”: o sinalizador de descarrilamento deixara de funcionar. Isso significa que, caso a composição saísse dos trilhos, como ocorreu no último dia 5, o condutor não seria avisado sobre o acidente e, portanto, não teria condições de acionar imediatamente os freios de emergência. Essa mesma falha ocorreu quando do último descarrilamento, um dos poucos na história do Metrô, e a pessoa que conduzia o trem só percebeu que havia algo errado quando viu usuários correndo pela passagem de fuga.

Isso mostra outra falha preocupante, na opinião dos metroviários: a cabine tampouco sinalizou para o condutor que as alavancas da saída de emergência haviam sido acionadas. Normalmente, o painel de controle tem de avisar o condutor sobre a abertura das portas quando o trem ainda está em movimento. Uma das possíveis consequências desse tipo de falha foi observada no dia 5: apesar de descarrilado e com as saídas de emergência acionadas, a composição continuou em frente, danificando o trilho eletrificado, provocando curto-circuitos, estouros e fumaça, e colocando em risco a vida de passageiros e funcionários do Metrô.

Procurada pela reportagem para comentar as falhas, a Companhia do Metropolitano não respondeu às solicitações feitas por e-mail e telefone.”


Comentários