Caminhoneiros
protestaram na Castello Branco (SP) por 15 horas /
Foto: Werther Santana/Estadão Conteúdo |
Ricardo Kotscho, Balaio do Kotscho
‘Com o esvaziamento das manifestações nas ruas e praças das cidades, os protestos tomaram o rumo das estradas e caminhoneiros bloquearam ontem 22 rodovias em nove Estados, fechando inclusive o acesso ao porto de Santos, que só foi liberado na manhã desta terça-feira.
Desde o dia 6 de junho, quando dois mil manifestantes do Movimento Passe Livre protestaram na avenida Paulista, em São Paulo, contra o aumento de 20 centavos nas passagens de ônibus, os protestos se espalharam por todo o pais e foram multiplicando sua pauta de reivindicações, que foi da PEC 37 ao combate à corrupção, dos gastos com a Copa à melhoria nos serviços públicos, atacando todos os governos, políticos e partidos.
Depois de três semanas, os protestos urbanos perderam o folego e foram para as estradas. O Movimento Brasil Caminheiros, liderado há 14 anos pelo empresário Nélio Botelho, que em 1999 fechou as principais rodovias do país e provocou até desabastecimento em algumas cidades, apresenta agora as mesmas reivindicações daquele tempo: redução do preço dos pedágios e do óleo diesel, entre outras benfeitorias para a categoria.
Mesmo depois que o governo de São Paulo suspendeu a cobrança de pedágio para caminhões sem carga, razão primeira do protesto, o movimento decidiu que continuará nas estradas até quinta-feira, infernizando a vida de quem precisa viajar.
É no mínimo estranho que os caminhoneiros de Nélio Botelho voltem aos bloqueios justamente agora que a situação estava começando a se normalizar nas cidades, depois que a maior parte das reivindicações do povo nas ruas foi atendida rapidamente pelos três poderes.
Na mesma hora em que as estradas eram fechadas, apenas 100 gatos pingados apareceram ontem no mesmo Largo da Batata, em São Paulo, que reuniu 65 mil pessoas do Movimento Passe Livre no último dia 17 de junho, desta vez para protestar contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-SP).
No início da noite, 40 pessoas saíram às ruas de Florianópolis para pedir mais ética na politica; 200 manifestantes pediram o fim da corrupção em Manaus; mais 200 saíram em Maceió contra a contratação de médicos estrangeiros; outros 80 fecharam a PR-116 em Fortaleza, pedindo sinalização e uma passarela; com pedidos variados, 60 protestaram em Foz do Iguaçu, o mesmo número que saiu às ruas em Santos para pedir a integração das tarifas de balsas e ônibus; só em Vitória o número chegou a 1.000 para pedir o fim da cobrança de pedágio.
Geradas nas redes sociais e amplificadas pela cobertura generosa da grande mídia, inclusive durante transmissões esportivas e em programas de auditório, as manifestações de protesto parecem seguir um roteiro para que não parem nunca mais, encadeando uma pauta na outra. Certamente não se trata da obra de um único e criativo pauteiro. Pode ser tudo uma grande coincidência, mas não custa perguntar quem podem ser seus autores e quais seriam seus reais objetivos, já que até hoje tudo nos é apresentado como algo espontâneo, que brota de uma difusa insatisfação popular não registrada pelas pesquisas nem pelos agentes da Abin.
Em seu artigo de hoje no "Observatório da Imprensa", sob o título "A história ainda não foi contada, falta o narrador", Alberto Dines deixa uma pergunta no ar:
"No sábado, 6 de julho, o vulcão completará um mês de atividade ininterrupta. Hora de perguntar: alguém já contou esta história _ como começou, mudou e o que ainda vai acontecer?".
Em busca de respostas, Dines constata: "Estamos observando os escombros, identificando vítimas, avaliando efeitos, conscientes da dimensão do ocorrido, testemunhas mais ou menos informadas. Poucos, no entanto, sabem com exatidão por que a cratera adormecida, de repente, começou a cuspir fogo".
Talvez só os historiadores do futuro, daqui a muitos anos, nos contem como foi construído e desenvolvido este roteiro.”
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