O contragolpe de Dilma


O risco de impeachment ainda existe.

Rui Maartins, Correio do Brasil

“Estava tudo preparado – mais alguns dias de agitação e, no 1 de julho, com a greve nacional, um pilantra acionaria o Supremo Tribunal Federal argumentando que diante da confusão reinante, das perdas do Brasil com a depreciação do real diante das outras moedas e da impossibilidade de se governar só havia uma solução – o impeachment da presidenta.

Joaquim Barbosa faria um sorriso de envaidecido, já sonhando com a faixa presidencial, e daria provimento imediato à demanda. E o STF que, no caso Battisti, queria mas não pôde enquadrar o ex-presidente Lula, assumiria o controle político do país, retirando Dilma do poder.
Para garantir o golpe, legal como foi o do Paraguai, haveria a rede da grande mídia, com a Globo caprichando nos closes dos ministros togados favoráveis ao impeachment.

E a Veja lançaria a capa sacralizando o golpe – o “STJ cassa (ou caça ?) Dilma”. Em letras grandes, as primeiras medidas a serem tomadas por quem assumisse o poder – acabar com as bolsas escola e família, abrogar a lei em defesa das domésticas, privatizar a Petrobrás, acabar com as cotas universitárias em favor de negros e índios, privatizar o ensino e a saúde, acabar com a maioria dos ministérios e secretarias de governo dentro de um plano neoliberal de reduzir o Estado ao mínimo e abrindo nossas fronteiras a todo e qualquer capital estrangeiro, numa espécie de suk ou mercado livre de nossas riquezas.

Só que Dilma foi rápida na reação, impedindo que as manifestações iniciadas com justos protestos contra o aumento de passagens de transportes públicos, acabassem sendo recuperadas por setores menos interessados pelo povo e mais por assumir o poder, a fim de reverter todas as conquistas sociais dos últimos anos.

Muitos dos reclamos dos manifestantes correspondiam às necessidades da população e constituíam falhas cometidas pelo governo, no afã de construir uma base governável. Feita a autocrítica, tomada a palmada na bunda, era preciso, e logo, garantir terem sido ouvidos os protestos.

O plebiscito por uma assembléia constituinte evita que fique com o STF a decisão sobre quem governa, e restitui ao povo sua soberania. É um sabor de democracia participativa ou de democracia direta, que os suíços utilizam com frequência.

O povo nas ruas fez uma série de reivindicações que serão catalogadas para se transformarem em lei por uma assembléia constituinte.

É verdade que, depois do encontro da presidenta Dilma com a direção da OAB, surgiram dúvidas no Planalto, se o caminho a seguir é realmente o de se convocar uma Constituinte, capaz de mudar a Constituição, dentro do projeto de Reformas políticas.

O ideal seria a presidenta Dilma não ceder à OAB, que embora tenha ações louváveis e de vanguarda em diversos setores, não deixa de ser o lobby do atual establishment jurídico brasileiro, cujo emaranhado dificulta o combate à corrupção no Brasil. Principalmente quando Dilma diz querer tornar a corrupção num crime hediondo.

Como aplicar uma Reforma política sem uma Constituinte ? Tão logo seja submetido o plebiscito ao povo e aceito, o governo Dilma deveria convocar a assembléia. Como nosso regime presidencialista não permite a dissolução do parlamento, a Constituinte se faria com os atuais parlamentares. Haveria o risco de entraves e mesmo de algumas leis serem desvirtuadas, mas esse é o risco da democracia direta.

Mas não se pode esquecer que feitas as Reformas na atual Constituição, teriam de ser aprovadas num referendo submetido ao povo. Se as reformas aprovadas não corresponderem aos anseios populares, elas poderão ser rejeitadas.

Em todo caso, seja qual for a decisão tomada, o Brasil, que evita reprimir as manifestações e que aceita discutir soluções com os manifestantes, dá uma grande prova de democracia para o mundo. Mesmo a Europa não tem esse jogo de cintura com os manifestantes.

(publicado originalmente no site Direto da Redaçao)
Rui Martins, jornalista, escritor, correspondente em Genebra.”

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