Comissão da Verdade para os crimes da PM paulista em 2006



“Ontem, policiais da Rota saíram a campo armados de balas de borracha e passaram a atirar aleatoriamente em qualquer ser vivo. Esse é o relato dos jornais sobre os abusos da PM.

Não deram sorte. As balas atingiram jornalistas, transeuntes, pessoas que estavam dentro dos ônibus. Foi um exercício sádico no alvo errado. Por isso, é possível que haja punições.

No dia 15 de maio de 2006, comandados por um Secretário da Segurança alucinado, Saulo de Castro, esses mesmos PMs, em São Paulo e na baixada santista, em carros da Rota ou encapuçados em motos, saíram matando jovens nas periferias. Mataram estudantes, transeuntes, pessoas que bebiam em bares. Mas acertaram o alvo: eram quase todos inocentes; mas eram todos anônimos de periferia.

Foram mais de 500 mortes. Mais de 500 mortes!

Foi uma ação planejada, na qual até os rádios das viaturas foram desligados, para não haver testemunhas. Para pegar a todos de surpresa, no dia anterior a Secretaria de Segurança avisou os cidadãos que poderiam ir tranquilamente a seus trabalhos, escolas. Dentre os assassinados, jovens sem antecedentes criminais, que foram para as aulas, por acreditar nos avisos da Secretaria, e terminaram executados na porta da escola.

O morticínio só interrompeu quando a sociedade civil, médicos do Conselho Regional de Medicina, procuradores, advogados, montaram plantão no Instituto Médico Legal. Não havia nenhumn jornalista testemunhando para não atrapalhar as eleições de 2006.

Procuradores com experiência em chacinas tiveram o cuidado de pedir para que se preservassem os atestados de óbitos. E o que se viu foram corpos crivados de balas, pelas costas, na nuca, em claro sinal de execução.

Quando foi feito o levantamento final, 80% dos mortos não tinham antecedentes policiais. Liberados por chefes tão assassinos quanto eles, os celerados comportaram-se como ontem, atirando a esmo, em que cruzasse com eles. E a sociedade paulista acovardou-se, miseravelmente acovardou-se. Os jornais esconderam o assassinato. O Ministério Público estadual não levou os inquéritos adiante. Nas ações cíveis, pouquíssimos juízes tiveram coragem de emitir sentenças condenatórias.

ONGs de direitos humanos pediram a federalização dos crimes e o Procurador Geral da República Roberto Gurgel acovardou-se e engavetou o pedido.

Não eram jovens de classe média, como ontem. Entre as vítimas, não havia jornalistas de grandes jornais. Os assassinatos não foram cometidos no centro da cidade, mas em bairros distantes. Foi um assassinato contra a população anônima. 

Essa operação plantou no seio da antigamente valorosa PM o ovo da serpente, da criminalização, da perda de controle.

Enquanto não se tiver uma Comissão da Verdade para os crimes de maio de 2006, a sociedade paulistana continuará doente.

Que as balas de borracha de ontem sirvam para levantar os crimes cometidos em 2006 com balas de verdade.”

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