Com protesto, sem protesto, com protesto … um malmequer político

Rui Daher, Terra Magazine / Blog do Rui Daher

Folhas e telas cotidianas mais uma vez atrapalhadas. Em meio às notícias sobre a Copa das Confederações, conjecturam possibilidades. Ocorrerão protestos? O povo cantará o Hino Nacional com o traseiro voltado para o campo? As descargas nos banheiros dos estádios funcionarão? Por que não declarar de uma vez o Taiti campeão? Afinal, como disse o poeta Aldir Blanc, "simpatia é quase amor".

Também andam atrapalhados os manifestantes, sobretudo os que estudam ou dizem que.

E disso, muitos de nós, sessentões ou mais, podemos falar de cátedra. Cacete! Nunca sabíamos se era para parar ou continuar. Descubro, enfim, que nada mudou.

Posso imaginar nas assembleias carinha tomando pito: "que merda você tinha que sair por aí dizendo que não mais iríamos convocar passeatas? quem te autorizou? vamos votar … levanta a mão aí quem …"

Pois é, estão dizendo que amanhã, se não hoje mesmo, que Dia de São João é (sugiro encontrarem-se na esquina com a Avenida Ipiranga), os protestos irão continuar. 

Caio fora. Vou ver se há plantinhas crescendo no interior profundo do País. No máximo, poderei encontrar um congestionamento de cafeeiros oferecendo seus frutos à colheita, no momento, cafeinada.

E pra não dizer que não deixei alguma lucidez no blog, aí embaixo a frequente de Janio de Freitas, ontem, na Folha de São Paulo. 

Entre baderna e política

Janio de Freitas

O tipo é bem conhecido. É aquele que anda em bandos para criar brigas ferozes, não raro mortais, a caminho dos estádios e depois nas arquibancadas. E arma brigas, não raro mortais, nas casas noturnas da pesada. E agride gays, e sempre em bando destrói partes de ônibus e de metrô, arrebenta nas ruas o que puder. A indumentária de todos é igual, o aspecto de suor e sujeira é igual em todos, a linguagem comum a todos é um dialeto da pobreza mental. São os exemplares mais completos da falta de civilidade.

Esses são os autores dos ataques, a prédios oficiais e outros alvos, que se diz decorrerem da "insatisfação generalizada" da população. E exprimirem o repúdio geral aos políticos, aos partidos e aos governos.

Uma semana antes da sociedade aproveitar a rejeição das novas passagens para mostrar sua "insatisfação generalizada", o Datafolha mostrava Dilma Rousseff capaz de vencer no primeiro turno qualquer combinação de adversários, apesar da perda de oito pontos em sua aprovação. Na véspera daquela manifestação, o Ibope constatava o mesmo, com igual perda, mas com maior aprovação.

Que uma das pesquisas errasse, seria admissível. Não as duas, com indicações tão equivalentes e diferenças cabíveis nas margens de erro. Nelas não aparece a "insatisfação generalizada", mas cabem ainda os efeitos do Bolsa Família, dos ganhos do salário mínimo, do desemprego em um dos níveis mais baixos do mundo (os Estados Unidos comemoram seus 7,6%, aqui é de 5,8% e estabilizado), ganho real na massa de salários, e outros fatores que fazem uma reviravolta de melhorias em dezenas de milhões de famílias.

A ideia de "insatisfação generalizada" facilitou aos que, perplexos com a grandiosidade das manifestações, ainda assim precisávamos dar pretensas explicações dos fatos. "Análises", dizem. Mas quais são as indicações convincentes de tamanha e tão disseminada insatisfação, isso não foi sequer sugerido.

A ser sugestiva de alguma coisa, a variedade temática dos cartazes (relativamente pouco numerosos) talvez confirme a regra de que não há, em lugar algum do mundo, classe social que não tenha do que se queixar ou reivindicar. E aqui temos de sobra, não é o caso de desprezar a oportunidade oferecida por uma iniciativa simpática e sem atrelamento partidário.

Generalizante, entre nós, com toda a certeza, é a repulsa aos congressistas. Mas nem isso faz o ataque ao Congresso ter mais do que as características, todas, de mera arruaça. Se a baderna dos delinquentes tivesse sentido político, haveria razões políticas, por exemplo, para o seu ataque ao Ministério de Relações Exteriores. E não consta que alguém fizesse o prodígio de encontrar alguma, uma que fosse.

O mesmo se pode dizer da depredação, no Rio, do sambódromo e do Terreirão do Samba, de quase cem luminosos de trânsito, carros particulares. Atos semelhantes em tantas cidades, e, em São Paulo, os saques a que os meios de comunicação preferiram não dar a devida atenção, exceto a TV Bandeirantes e, em parte, a TV Record. Saquear toda uma joalheria de bom tamanho, a ponto de não deixar nem uma só peça, nem é mais baderna desatinada.

A propósito, deve-se às PMs do Rio, de São Paulo e de Brasília que não ocorresse o inimaginável na noite bárbara de quinta-feira. As três, apesar de bastante agredidas, foram capazes de manter o autocontrole, com erros apenas individuais e que não diminuem o mérito.

Em outro plano, mas na mesma linha de maturidade e bom senso, foi a aliança decisória do governador Geraldo Alckmin e do prefeito Fernando Haddad. Estão sendo capazes da rara grandeza de situar o interesse público e situar-se acima do interesse político e partidário. O oposto do oportunismo barato de Rui Falcão, presidente do PT, ao conclamar à provocadora partidarização petista da passeata apartidária.

A atribuição desmedida de caráter político às passeatas, feita nos meios de comunicação e oriundos de universidades, deu forte contribuição às tensões propagadas e às dificuldades de decisão, antes e agora, dos poderes públicos. Venha o que vier por aí, nas ruas, seria muito proveitoso não confundir baderneiros com radicais e falta de civilidade com protesto político.”  

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