O fado fúnebre que ensurdece o Brasil


“A ortodoxia está matando nações na Europa. O desemprego passa de  17 milhões de pessoas. Na Espanha, 26% da infância encontra-se  enredada na teia da pobreza, que recobre a 4ª maior economia do euro. A cada 15 minutos uma família é despejada em Madrid, Barcelona ou em algum outro ponto do país. Dizer Estado mínimo é eufemismo. O que restará depois dos sucessivos e inalcançáveis ajustes serão talvez  protetorados, enclaves, colônias. Resíduos de nações expropriadas pelos mercados.  O patrimônio comum esfarela.  O uso de viaturas em muitas repartições portuguesas passou a depender da vaquinha dos funcionários para a gasolina. Papel higiênico deve ser trazido de casa (leia a coluna de Flávio Aguiar; nesta pág). 

Tatcher, o símbolo disso tudo,será enterrada dia 17 próximo. A lógica que encarnou enfrenta  o seu crepúsculo, mas usa as próprias cinzas para tornar irrespirável a vida em sociedade. No Brasil, lamenta-se que Dilma não seja uma ‘ladra do copo de leite', a exemplo da ‘Dama de Ferro', que ajustou a merenda da escola pública inglesa.

O governo resiste em trazer a crise para dentro do país. O  rentismo inconsolável exige o ‘laissez-passer' para legitimar a ‘purga'  que se inveja na Europa. Desdenha-se do ‘efeito provisório' das linhas de passagem erguidas para atravessar o cerco que se aperta. Como se o  estado de exceção criado pela desordem neoliberal pudesse ser enfrentado com as ferramentas da rotina. De cada três palavras difundidas pelo noticiário uma é juro ( leia mais aqui) . Colunistas  se ressentem de demissões frescas. Implora-se por números azedos para servir no café  da manhã.

É preciso abrir espaços à incerteza no jantar. Professores-banqueiros e candidatos à Presidência tem um prazo de validade contratado. A crise deve aportar  antes que o PAC, a reindustrialização do pré-sal e  a indução do investimento surtam efeito. Um centímetro de chão sólido atrapalha tudo.  Abengalados ora no quilo do tomate, ora na novena pervertida em prol da seca, seu futuro pressupõe que o emprego, a casa, a comida, o salário e a autoestima sejam tragados em uma gigantesca restauração rentista, que  solde a economia ao comboio do abismo. Do governo o que se espera é que engrosse o fado fúnebre, a adestrar o país para ser um imenso Portugal.”

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