Mauro Santayana, Blog: MauroSantayana
“Oficial das
Forças Armadas da Venezuela, Hugo Chávez conhecia a história de seu país, e se
fez intransigente devoto cívico de Bolívar. Seu sonho, como o dele, era o de
unir a América Latina sob uma só bandeira. Essa tem sido a utopia de muitos
líderes continentais: juntos, os nossos países seriam capazes de resistir a
qualquer tentativa de domínio estrangeiro.
O presidente da
Venezuela teve uma visão intuitiva do Estado, mas seria estultice nele não
reconhecer excepcional líder político. Quando, em Santiago, o rei da Espanha a
ele se dirigiu, com a insolência conhecida, insultando-nos a todos, Chávez
poderia ter respondido à altura, dizendo que não se calava, porque
representava os povos da América ocupados, dizimados e explorados vilmente
pelos nobres da Espanha (e não pelos seus povos), desde a sua chegada ao nosso
Hemisfério, com armas e embustes. Os espanhóis de hoje, associados aos
portugueses, acreditavam, até que a crise caiu como uma pedra sobre suas
cabeças, que podiam, ardilosamente, substituir os anglo-saxões e recuperar o
antigo império de Carlos V e Felipe II.
A nossa história
tem sido a do confronto permanente entre os patriotas e os vassalos e feitores
dos colonialistas, que a eles se associam para saquear os bens naturais e
explorar os nossos trabalhadores. Chávez faz lembrar outros grandes heróis,
como Bolívar e seus contemporâneos, vindos das fileiras militares, e os que se
seguiram, quase sempre oriundos do povo trabalhador. É uma razoável sucessão de
bravos combatentes, de Tupac Amaro a Benito Juarez; de Juarez a José Marti, de
Marti a Emiliano Zapata; de Zapata a Sandino; de Sandino a dom Oscar Romero, de
El Salvador. Isso sem falar nos brasileiros, de Tiradentes a Vargas.
Chávez, que morreu
na tarde de ontem em Caracas, insurgiu-se contra o governo corrupto de Carlos
Andrés Perez, há 21 anos, quando ainda não chegara aos 40. Malograda a
insurreição, preso e anistiado, deixou as fileiras e iniciou o movimento
democrático que o elegeu e o reelegeu, não obstante a oposição feroz das
oligarquias, financiadas e orientadas pelas multinacionais, pelos banqueiros e
pelos interesses geopolíticos dos Estados Unidos.
O ex-presidente
venezuelano foi visto como um populista, mas o vocábulo, como sabemos, é
ambivalente. Pode identificar um demagogo vulgar ou o líder realmente
preocupado com a maioria de seus concidadãos, que trabalhavam arduamente para
ganhar apenas o suficiente para que se mantivessem vivos, desnutridos, vivendo
em favelas, sob a violência, sem assistência à saúde – e o que é pior, sem
esperanças. Chavez, sem violar as regras democráticas, e usando os recursos do
país, ofereceu-lhes pão, esperança e dignidade.
Como o
mítico Cid, El Campeador, que, morto, teve corpo amarrado à sela de seu cavalo,
e venceu a batalha de Valencia, em 1099, Chávez continuará a comandar
seus seguidores, e por muito tempo ainda, muito mais do que esperam, ou
desejam, seus adversários.”
Comentários