Mauro Santayana, Blog do MauroSantayana
“A justiça
chilena determinou a exumação dos restos mortais do cidadão chileno Neftaly
Ricardo Reyes, o poeta Pablo Neruda. Suspeita-se que Neruda tenha sido
envenenado pelos esbirros de Pinochet, dias depois da morte de Allende, no
golpe de 11 de setembro de 1973 – há quase 40 anos. Neruda, que se preparava
para asilar-se no México - em uma concessão dos golpistas, sob pressão
internacional - foi internado em uma clínica, com uma crise prostática. Ali,
segundo denúncia de seu motorista, recebeu a falsa medicação que o matou.
Os poetas – e
poucos que redigem poemas conseguem ser realmente poetas – pertencem a outra
espécie de seres humanos. Encontram-se na vanguarda das emoções e dos
sentimentos. Isso leva a maioria deles a desfazer-se dos escolhos das
circunstâncias e exilar-se em geografia e tempo alheios, mas sem perder a
bússola da realidade, sem perder sua paisagem e sem perder o seu povo.
O Chile
teve dois prêmios Nobel de Literatura. O primeiro foi outorgado, em 1945, a Lucila de Maria del
Perpétuo Socorro Godoy Alcayaga, que usou o nome de Gabriela Mistral. Pablo e
Gabriela foram amigos. Quando Gabriela fez 15 anos, em 1904, Neruda nasceu. Gabriela,
com seu nome literário, homenageou dois grandes poetas de seu tempo, o italiano
Gabriele d’Annunzio e o francês da Provença, Fréderic Mistral.
Pablo Neruda,
com seu pseudônimo, prestou homenagem ao grande poeta tcheco do
século 19, Jan Neruda – que denomina à mais bela das ruas de Praga e uma das
mais bonitas do mundo, a que saí de Mala Strana e sobe ao castelo de Hradcany. Os
quatro, ícones e discípulos, tiveram a marcá-los o sentimento nacionalista.
Matar poetas tem
sido o grande prazer dos fascistas contemporâneos e dos tiranos de todos os
tempos. O assassinato de Federico Garcia Lorca é conhecido. O autor de Romancero
Gitano, traído, por medo, pelo amigo que o escondera, foi fuzilado nos
primeiros dias da insurreição de Franco, por ordem do general Queipo de Llano. Neruda
- que foi um dos melhores amigos do povo brasileiro - pretendia, do exílio,
lutar contra Pinochet. É o que parece ter ocorrido contra Pablo Neruda.
Matar de forma dissimulada é uma prática também dos serviços norte-americanos,
como a CIA reconhece.
Há várias formas
de matar os poetas. O fascismo, sendo o avesso do humanismo, é o assassinato
permanente da poesia – e dos poetas. O franquismo, além de fuzilar Lorca,
matou de tifo e tuberculose, na prisão, Miguel Hernández, aos 31 anos; e alguns
outros, como Antonio Machado, de tristeza, solidão e angústia, no exílio, como
Antonio Machado.
Mesmo que não
houvesse sido envenenado, Neruda morreu com o golpe. Morreu com os escolhidos
no Estádio Nacional de Santiago, e chacinados por ordem do usurpador. Morreu com sua gente.”
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