Segundo o
ex-presidente, "integração
é uma palavra
fácil de ser falada, mas
difícil de ser
colada em prática"
(Foto: Ricardo
Stuckert/Instituto Lula) |
O ex-presidente considera a integração é “uma palavra muito fácil de ser
falada, mas muito difícil de ser colocada em prática, tais os problemas
políticos, as incompreensões e os preconceitos” que cercam o tema.
“Lamentavelmente, aqui na América Latina se adotou uma política esperta,
de nos dividir. (...) Sempre houve preconceito, sempre houve uma preocupação
maior de relação preferencial com os EUA... ou com a Europa... ou com qualquer
um, menos entre nós mesmos. Entre nós existia um processo de desconfiança
generalizado. E era uma coisa cultural, porque vem inclusive muito baseada na
formação de nossos embaixadores, de preconceitos e mais preconceitos entre nós.
Não tem explicação, depois de mais de 500 anos, eu inaugurar a primeira ponte
entre Brasil e Bolívia; não em explicação, depois de mais de 500 anos, eu
inaugurar a primeira ponte entre Brasil e Peru. Nós estávamos, de forma muito
conscientes, voltados para a Europa e os EUA, e de costas para nós”, disse
Lula.
Ele adiantou que a ideia agora é os intelectuais dos vários países
trabalharem em conjunto para fornecer subsídios não apenas aos governos, mas
também à sociedade.
“Queremos aprender com vocês, saber o que vocês estão pensando esse tema
na academia (…) para que sejam criados instrumentos para avançar na
integração.”
Debates
Após a fala de Lula, a primeira mesa de debates teve Aldo Ferrer,
economista, ex-ministro da Economia, atual embaixador da Argentina na França, e
Marco Aurélio Garcia, assessor de Relações Internacionais da Presidência da
República do Brasil.
As intervenções ressaltaram que a América Latina vive um momento de
avanços, com governos progressistas, democracia avançando e melhorias sociais. "Nunca
tivemos um momento tão propício para este debate", destacou Aldo Ferrer,
que ressaltou três mudanças fundamentais que já aconteceram, a melhora na
qualidade das lideranças, o que possibilitou a ênfase no social; o fracasso do
neoliberalismo e da crença de que o mercado sozinho resolveria a todos os
problemas e a consolidação da democracia.
Marco Aurélio Garcia alerta, no entanto, que não se pode tratar esse
momento como “um parêntesis progressista em uma história conservadora”. As
políticas sociais parecem ser a grande marca desse novo direcionamento
progressista da região, com resultados concretos que já têm proporcionado.
Diversas intervenções dos intelectuais coincidiram ao apontar a
necessidade de uma ênfase na inovação, na técnica e na indústria com
maior valor agregado. “Brasil e Argentina vendem juntos dois terços das
proteínas do mundo, mas não agregam valor a esses bens”, disse o economista
argentino Bernardo Kosacoff, ex-diretor da Comissão Econômica para a América
Latina e o Caribe (Cepal), lembrando que é necessário aproveitar o enorme
mercado interno da região e “levantar nossa auto-estima”. O senador uruguaio
Alberto Curiel também enfatizou a necessidade de infraestrutura produtiva
integrada e mais valor agregado aos produtos da região. “Temos vários desafios
que eu não sei como resolver. É preciso falar com empresários, o Lula está
fazendo isso, é preciso falar com trabalhadores, o Lula está fazendo isso, é
preciso falar com movimentos sociais, e o Lula já fez isso…”
Curiel criticou, no entanto, a falta de planejamento estratégico, embora
reconheça os avanços sociais em toda região. Salomón Lerner, ex-primeiro
ministro do Peru, concordou. “Hoje, quem planifica, quem faz pensamento
estratégico são as multinacionais. A participação dos grupos políticos no
governo é cada vez menor. A questão é como fazer para que essas militâncias, no
momento progressista em que vivemos, participem da política. E não que a
política seja discriminada como incapaz, corrupta e inoperante.”
O cientista político uruguaio Álvaro Padrón se uniu ao coro ao comemorar
os avanços significativos na redução da pobreza e da desigualdade, mas alertou
para os limites desse processo. “Foi a primeira vez que tivemos democracia,
crescimento, distribuição de renda. Mas isso só não se traduz em desenvolvimento.
Precisamos ter ganhos de produtividade, sem isso, atingiremos
um limite muito em breve. Esse
é o desafio fundamental.”
A cientista política Ingrid Sarti, presidente do Fórum Universitário
Mercosul (FoMerco) agradeceu ao Instituto Lula por intervir justamente no
desafio de levar o pensamento da academia para as instâncias decisórias. “Como
professora, faço parte desse trabalho árduo de pesquisa, que muitas vezes acaba
engavetado. É muito importante que o Instituto Lula possa ser um motor dessa
articulação e dar algum auxílio à formação de políticas públicas.”
Theotonio dos Santos, economista da
Universidade Federal Fluminense, afirmou que uma integração comercial daria
mais poder de negociação internacional à América Latina. “O Chile tem 40% do
cobre do mundo e entregamos esse produto abrindo mão da capacidade de
influenciar o preço internacional dele.”
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