Ricardo Kotscho, Balaio do Kotscho
"Bem
verdade que a mídia, a impressa e a eletrônica, aprecia a poeira, dando mais
importância ao pó do que à ideia em si"
(Quincas Borba, o grande personagem de Machado de Assis, citado na coluna
dominical de Carlos Heitor Cony, na "Folha").
Passei alguns dias na praia pensando exatamente nisso: por que nós, jornalistas, não podemos encontrar outros assuntos na vida fora daqueles que vivem prevendo o fim do mundo, a crise de todas as crises, com ou sem calendário maia, anunciando sempre um apocalipse semanal?
Por isso, voltei à cidade disposto a mudar o disco do Balaio, dar uma virada neste jogo que está se tornando enfadonho para mim mesmo e, imagino, também para os leitores.
Acontece que eu também leio jornais e revistas, acompanho televisão e internet, e acabo como todo mundo impregnado pelas nuvens cinzentas do noticiário negativo sobre os rumos das nossas vidas aqui dentro e lá fora.
Não tenho uma linha direta com Deus para saber o que vai acontecer. Procuro apenas tentar entender o que está acontecendo e o que pode acontecer a partir dos fatos dados pela realidade que nos é retratada pelos meios de comunicação.
Para conseguir isso, busco sempre falar com pessoas de todas as áreas, do governo e da oposição, mas elas também têm suas opiniões próprias, também são infuenciadas pelo meio em que vivem e procuram puxar as sardinhas para as suas brasas.
Todo começo de ano é a mesma coisa. Não é porque a folhinha do calendário passou de um ano para outro que de uma hora para outra o que era feio vai ficar bonito e o que não tinha solução vai ficar resolvido.
Seca no nordeste, enchentes no sul, mortes e violência para todo lado, níveis dos reservatórios baixando, o que não falta é coisa ruim, problema, desgraça.
Como o Quincas Borba, continuamos dando mais importância ao pó do que à ideia em si. E qual é a ideia em si?
A vida continua seguindo igual, chove mais aqui e menos ali, a luz não apagou, os aviões continuam subindo e descendo, assim como as marés, a presidente Dilma marca novas reuniões para melhorar o desempenho da economia, os novos prefeitos começam a colocar ordem na casa, nas padarias tem pão quente na chapa e logo volta o futebol dos domingos.
Prometo pelo menos hoje não falar do embate político que segue feroz, está por trás de tudo isso e vai seguir assim até 2014, mas a vida não pode ser só isso. Lá fora as pessoas continuam passeando pelas calçadas e pensando nas suas próprias vidas, e é isso que vou fazer agora.
Bom domingo a todos.”
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