Numa crítica à medida do governo federal
que prevê a redução na tarifa de energia elétrica, o editorial da Folha de
S.Paulo deste sábado começa com a seguinte frase: "Dinheiro não nasce em
árvore". Apesar de defender ser "importante" a redução no custo
do insumo, o jornal lembra que, ao anunciar um desconto de 20% na conta de luz
dos brasileiros, o governo "precisa impor uma perda a outros atores
envolvidos na cadeia energética".
O texto afirma que o discurso do estados de
São Paulo (Cesp), Minas Gerais (Cemig), Paraná (Copel) e Santa Catarina
(Celesc) tiveram "base em sólidos argumentos e números" para revelar
o prejuízo ao aderir à proposta. A Folha conclui que é compreensível que
"o Planalto viva dias de inquietação diante dos resultados frustrantes da
economia na primeira metade do mandato de Dilma", mas que não se deve
reduzir a energia "à custa da insolvência das empresas ou do aumento de
subsídios e do endividamento dos governos".
Leia abaixo a íntegra do editorial:
Conta
elétrica
Como diz a máxima popular, dinheiro não
nasce em árvore. Quando o governo federal anuncia o plano de reduzir em 20% a
tarifa média de eletricidade cobrada dos consumidores, precisa impor uma perda
equivalente a outros atores envolvidos na cadeia energética.
Além da própria União, que assumiu uma
redução de seus tributos sobre eletricidade, empresas geradoras, companhias
transmissoras e governos estaduais foram convidados a pagar a conta.
Brasília oferecia prorrogar licenças de
geração e transmissão, as quais estão para vencer ou já expiraram, e indenizar
as concessionárias por investimentos mais recentes, que ainda não foram pagos
-amortizados, no jargão contábil.
Aos Estados caberia uma perda indireta de
receita, pois o ICMS sobre a energia mais barata vai arrecadar menos. Além
disso, alguns governos são controladores de estatais de geração, transmissão e
distribuição. Tinham de decidir se a adesão ao plano seria benéfica ou
prejudicial para essas empresas.
No setor de transmissão não houve recusa. Todas
as companhias envolvidas -inclusive as controladas pelos governos mineiro e
paranaense- aceitaram a proposta federal.
No campo da geração, no entanto, as
estatais de São Paulo (Cesp), Minas (Cemig), Paraná (Copel) e Santa Catarina
(Celesc) não endossaram o acordo. Alegaram, com base em sólidos argumentos e
números, que a adesão seria letal para seu equilíbrio financeiro.
O que vinha sendo uma negociação técnica
das mais espinhosas tornou-se então matéria de politicagem. Num discurso
inócuo, a presidente da República acusou os governadores cujas estatais não
aderiram a seu plano de "imensa insensibilidade".
Entende-se que o Planalto viva dias de
inquietação diante dos resultados frustrantes da economia na primeira metade do
mandato de Dilma Rousseff, indicando o fracasso das várias tentativas federais
de reanimá-la. Diminuir o custo da energia decerto seria uma medida importante
a devolver um pouco da competitividade perdida pelo setor privado brasileiro.
Não se pode fazer isso, todavia, à custa da
insolvência das empresas ou do aumento de subsídios e do endividamento dos
governos. Seria apenas mudar o problema de lugar, sem resolvê-lo.
Usinas elétricas e companhias transmissoras
deveriam compensar uma parte da redução de tarifas com ganhos de produtividade
e eficiência. Mas esse é o limite sustentável de sua contribuição.
A outra parte cabe aos governos -federal e
estaduais. Trata-se, também, de melhorar sua eficiência. Para cada R$ 1 de
tributo abatido da energia, é preciso garantir R$ 1 de corte na despesa
pública.
Qualquer plano para baixar as contas de luz
que desobedeça tais princípios basilares da responsabilidade fiscal será mero
populismo.”
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