Dilma: a esquerda chega ao poder

Para o deputado Arlindo Chinaglia, a nova presidenta é a primeira representante de esquerda de fato a chegar ao poder no país. A dimensão disso na condução do país, porém, dependerá do peso que terão as forças mais conservadoras num governo de coalizão

Rudolfo Lago, Congresso em Foco

O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP) disse que só um momento o emocionou de fato no discurso de posse da presidenta Dilma Rousseff: a menção que ela fez à memória daqueles que tombaram na luta contra a ditadura militar. No coquetel oferecido para convidados no Itamaraty na noite de sábado, após as solenidades da posse, Chinaglia repetia que era a primeira vez, desde a derrubada da ditadura e a redemocratização do país, que um chefe de Estado homenageou em discurso aqueles que morreram no combate ao regime de arbítrio dos militares. Mais do que isso, Dilma demonstrou todo seu orgulho de ter participado da geração que pegou em armas contra ditadura, seja pelas palavras no seu discurso, seja por gestos, como o convite que fez às suas 17 companheiras de cela no período em que ficou presa em são Paulo no Departamento de Ordem Política e social (Dops) em São Paulo.

- É a primeira vez que se dá o devido valor à importância que essa resistência à ditadura teve - comentava Chinaglia.

No discurso de Dilma, na presença das senhoras que estiveram presas com ela, Chinaglia enxergava a chegada ao poder, pela primeira vez, de uma representante de fato do que se convencionou chamar de esquerda: o grupo de pessoas que acreditou numa saída revolucionária, socialista, para o mundo. Gente como o próprio Chinaglia.

A história da reconstrução democrática brasileira começa com Tancredo Neves. Tancredo era um político conservador. Combatia a ditadura pelo fato de ser um democrata convicto, por acreditar que o melhor para a condução de um país é o sistema de pesos e contrapesos da democracia, com suas vozes de apoio aos governos e de oposição. Tancredo morreu antes de chegar ao poder e entregou o país a quem nem mesmo essa convicção tinha. Antes de romper com o regime militar e formar a coalizão que o tornou vice de Tancredo, José Sarney era ninguém menos que o presidente do PDS, o partido que apoiava a ditadura.

Fernando Collor não tinha qualquer ligação com qualquer grupo que tenha combatido a ditadura. Chegou a ser filiado ao PMDB, mas depois de redemocratização. Sua vitória na primeira eleição direta após a ditadura foi produto especialmente da inovação que trouxe: o uso do marketing, capaz de captar e produzir as frases de efeito que melhor traduzem no momento o que o povo quer ouvir. Artificial como um refresco de pacote, Collor durou o tempo que duram as coisas artificiais. Dois anos depois, estava deposto do poder. Sucedeu-o Itamar Franco, outro político de caráter mais conservador e convicção democrata, semelhante a Tancredo.”
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